quinta-feira, 23 de agosto de 2007

Equívocos no caso Madeleine

O crime organizado e o terrorismo têm mostrado, nas últimas duas décadas, a sua capacidade para abalar mesmo os governos mais desenvolvidos, afectando a qualidade de vida das pessoas que habitam a parte do mundo politicamente mais bem organizada. O tráfico de pessoas em geral e de crianças em particular – quer para adopção, quer para fins pedófilos –, tem proliferado de modo que se constitui hoje uma ameaça transnacional. Na hipótese da criança inglesa ter sido raptada do empreendimento da Praia da Luz, o que é correcto, do ponto de vista investigacional, é a cooperação com outras polícias de outros países. Contra ameaças transnacionais, intervenção policial transnacional! Por isso, e ao que parece, a polícia de investigação portuguesa tem procedido bem. E as sugestões que querem fazer parecer estranho a cooperação com a polícia inglesa, são apenas, no mínimo, equívocos mais ou menos orquestradas para efeitos comerciais de alguns órgãos de comunicação social, digamos, mais precipitados.

Outro (aparente) embaraço neste caso mediático-policial prende-se com a questão da informação. Também aqui não pode haver grandes perplexidades. É unânime hoje nos investigadores em história militar, que a informação – que se tornou vital nos conflitos belicosos, desde o surgimento do rádio – tem hoje um papel principal naquilo que já se chama “guerra da informação”, que consiste, grosso modo, em manipular a maior quantidade e qualidade de informação, negando o seu benefício aos adversários! É perfeitamente consequente o trabalho da PJ com a procura, tratamento e “sonegação” (entenda-se: não divulgação) de informação neste caso, quando se trata de trabalhar provavelmente frente ao crime organizado, com as potencialidades que este hoje possui. Se houver algo a apontar talvez seja a divulgação excessiva, na tentativa sempre árdua de articular o segredo de justiça com o direito dos cidadãos à informação.

Claro que, diante desta enorme – inevitável, com certeza – confusão informativa veiculada pelos media (veja-se a esquizofrenia dos media britânicos, que agora já admitem a tese da morte da criança, que até ontem era usada como mais uma crítica à actuação da polícia e media portuguesas), associada à sempre legítima e compreensível ansiedade dos familiares, para além dos estranhos contornos de “crime (quase) perfeito”, tornam este caso de investigação policial – convém não esquecê-lo! – sumamente mais complexo do que qualquer caso literário ou cinéfilo!

(P.S.: Benvinda seja a lei comunitária – agora em projecto – que pretende harmonizar o direito penal em todos os países da UE, no que toca a crimes praticados contra crianças.)

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