quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Propaganda ou futuro?

No início da semana a ME, Maria de Lurdes Rodrigues, anuncia o paraíso: em breve haverá 100% de sucesso no final do 9.º ano de escolaridade, alegando que estão reunidas em Portugal as mesmas condições que têm permitido que isso aconteça em muitos países da Europa.

Todavia, este argumento de MLR suscita – a quem se interessa, de facto, por estas questões – duas dúvidas.

1. O que entende MLR e o ME por sucesso escolar? Será um quadro de resultados positivos no final do ensino básico, independentemente daquilo que os alunos, de facto, tenham apreendido, em termos de conhecimentos e competências? Se assim for, como já tive, infelizmente, oportunidade de referir, basta “levantar o pé” e os resultados – não as aprendizagens – “melhoram” e é bem possível atingirem o místico número 100 (%)! E como se “levanta o pé”? Através da megaburocratização kafkiana que pressiona os professores que detenham informações necessárias e suficientes para reprovar o aluno (fazê-lo reaprender melhor!) e através de exames de conhecimentos e competências de “fácil acesso para todos”!

2. Depois, é importante perguntar que condições são as necessárias, que existem nos países em que o sucesso é, de facto, de 100%, que a ME afirma existirem em Portugal. A sra. Ministra não as referiu, a não ser que entenda que essas sejam os “factos” dos nossos alunos serem tão capazes como os europeus, dos nossos professores serem tão qualificados e empenhados como os seus congéneres do restante sol poente e das escolas estarem, em breve, transformadas em escolas do (nosso) futuro… (em termos informáticos, claro!) Mas será que a nossa escola está efectivamente organizada para incrementar hábitos de trabalho e de verdadeira aprendizagem de conhecimentos e competências nos alunos como uma imperiosa necessidade de sobrevivência no mundo de hoje? E os encarregados de educação, terão a mesma concepção dos seus congéneres europeus acerca da verdadeira importância da escola e dos hábitos de trabalho que devem incutir aos seus educandos para a ela se adaptarem e, com isso, crescerem como seres humanos melhor adaptados ao exigente mundo da vida?

Sejamos claros: há francas possibilidades – ou é necessário acreditar nisso – para que o verdadeiro sucesso atinja todos os alunos no ensino básico. Mas são, neste momento, apenas possibilidades, que é necessário colocar em acto!

A sra. Ministra esquece que as verdadeiras condições para atingir tal meta passam por, entre outras: aumentar o número de horas semanais que o curriculum em Portugal, ao contrário do resto da Europa, dedica à Matemática e à língua materna; diminuir o tempo que os alunos passam em áreas não curriculares, como “estudo acompanhado” e, principalmente, “área de projecto” (não tanto porque estas áreas de estudo não façam sentido, mas porque é necessário disponibilizar mais tempo para aquelas disciplinas nucleares); restituir aos professores o tempo, a serenidade e a confiança necessários para que, enquanto eternos apaixonados estudantes que são (devem ser ou devem mostrar que o são!), façam o seu trabalho, que consiste, não em preencher papéis inúteis, mas em preparar (científica e didacticamente) o contacto das crianças e dos jovens com o fabuloso mundo da cultura e do conhecimento humano; e, at last but not least, incrementar, junto dos encarregados de educação, uma verdadeira atitude de orientação responsável e atenta dos seus educandos, instituindo, por exemplo, hábitos de verdadeiramente consequentes visitas às escolas dos filhos, onde encontrarão professores devidamente sensibilizados e qualificados (que os há, embora seja, com certeza, necessário mais e melhor) para os aconselhar, porque a educação é tão importante ou fulcral quanto a saúde! (Haverá, por exemplo, algum item programático no curriculum da educação para adultos, ao nível das Novas Oportunidades, que contemple tão elevado desígnio? Ou a ideia é mesmo apenas atribuir diplomas para aumentar as salvíficas estatísticas?!)

Quando um Ministro da Educação profere aquelas belas palavras, das duas uma: ou tem na sua posse sólidos elementos para mostrar como isso é, efectivamente, possível e quando; ou então está apenas a autopromover-se com vista a uma outra finalidade, que não a de incrementar políticas educativas. É fácil, com o nível cultural e a “filosofia” de vida de muitos encarregados de educação hoje em Portugal, apelar às emoções do povo (mas mesmo assim, já há quem esteja atento)! Mais difícil – porque mais exigente, embora não impossível – é pensar profundamente políticas educativas de verdadeiro sucesso para um verdadeiro futuro de possibilidades para todos.

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