quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Dar a pensar...

[Novas tecnologias e qualidade do ensino]

«De há muito que o fascínio pelas tecnologias influenciou as políticas educativas e as práticas pedagógicas. Basta lembrar o papel que a televisão teve no ensino à distância, a importância do vídeo no alargamento dos conteúdos didácticos, a máquina de calcular para a matemática e mais recentemente a importância do ensino assistido por computador, os projectores de imagem, os quadros interactivos ou a Internet para a diversificação dos instrumentos de trabalho e para o acesso a uma informação abundante susceptível de enriquecer qualquer aula em qualquer domínio do saber.

Esse fascínio, porém, raramente correspondeu aos resultados alcançados, especialmente no domínio da qualidade do ensino.

A investigação científica neste domínio não tem sido conclusiva relativamente aos ganhos de qualidade expressos em resultados de testes de avaliação. Reconhece-se que os alunos aprendem mais em menos tempo, demonstram atitudes mais favoráveis à aprendizagem, em especial nas experiências que exigem um elevado nível de raciocínio e de resolução de problemas, tendem a desenvolver práticas mais cooperativas, mas em todas estas situações verificou-se ser decisivo o papel do professor, especialmente o que beneficiou de formação ajustada ao tipo de ensino que praticava.

Há um ganho evidente na familiarização dessas novas tecnologias com as quais vai ter de lidar na sua vida futura. Contudo, as tecnologias não passam de instrumentos, sofisticados e atraentes, sem dúvida, mas tão-só instrumentos. Se o aluno não sabe estruturar um texto argumentativo, não há nenhum processador de texto que o ajude. Se não sabe interpretar o enunciado de um problema, não será a folha de cálculo que o fará. Se não sabe formular um problema, nenhum programa o ajudará a encontrar a melhor solução.

Quer isto dizer que o fascínio pela tecnologia pode rapidamente transformar-se numa ilusão, esta sim extremamente negativa para o processo educativo, se conduzir à desvalorização do que é fundamental, ou seja, o desenvolvimento de competências cognitivas, capacidade de raciocínio lógico, domínio das maneiras de pensar cientificamente conduzidas. Em síntese, saber pensar.
(…)
De pouco vale a tecnologia se ela não for utilizada para o desenvolvimento de processos educativos cada vez mais complexos. É pela educação que se chega à tecnologia e não o contrário. Por isso, torna-se decisivo pensar primeiro naquela e só depois nesta, sob risco de estarmos a criar novas ilusões, tão frustrantes quanto tantas que a antecederam.»

David Justino, Difícil é Educá-los (Lisboa: Fundação Francisco Manuel dos Santos, 2010) 83-4.

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