[Sobre educação e equidade social]
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«Há inquestionavelmente um processo de democratização do ensino que se expressou timidamente ainda durante o Estado Novo e que explode de forma quase incontrolável nas duas primeiras décadas do regime democrático. Nesta perspectiva, não tem comparação a dimensão desse acesso nos dois regimes.
Porém, se o regime autoritário seleccionava na passagem do ensino primário para o liceal, o sistema de ensino “democrático” não deixa de o fazer de forma mais imperceptível: selecciona ao longo do trajecto escolar do aluno através das reprovações e das desistências, bem expressas pelas mais elevadas taxas de reprovação e de abandono escolar que são registadas no conjunto dos países europeus. Ou seja, cria-se a ilusão de um fácil acesso, mas depois enfrenta-se um sistema de ensino que não está concebido para ter sucesso.
Só existem duas formas extremas de responder a este efeito de discriminação: fazer baixar os níveis de exigência em nome da equidade social ou, mantendo os níveis de exigência, melhorar os métodos de ensino e mobilizar todos os recursos para prevenir essa discriminação. Como é evidente, o primeiro tipo de solução é o mais fácil de concretizar, mas a prazo rapidamente se conclui que não passa de uma perigosa e irrecuperável ilusão.
É no contexto desta tensão entre equidade social e qualidade de ensino que se criam as condições para a afirmação das visões “românticas” que tendem a confundir a consequência com a causa ou a desvalorizar os meios em função de um fim superior. Esquecem que a melhor forma de atingir esse fim não será “descer” ao aluno, mas fazê-lo “subir” a um nível superior de capacidade intelectual. As deficiências culturais só se superam com mais trabalho, maior capacitação e não iludindo a sua existência. Por isso, na maior parte dos casos, a preocupação de discriminar positivamente os mais fracos traduz-se num reforço dessa mesma fragilidade.»
David Justino, Difícil é Educá-los (Lisboa: Fundação Francisco Manuel dos Santos, 2010) 89-90.
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