terça-feira, 5 de junho de 2007


Leituras...



...com mais de uma década, mas que comemoram exemplarmente o dia Mundial do Ambiente. Entre a já abundante bibliografia na área da filosofia do ambiente, será justo destacar uma obra que merecidamente pode muito bem ser apresentada como um clássico, pelo menos nos títulos disponíveis na língua de Camões: Luc Ferry, A Nova Ordem Ecológica, Edições Asa (Lisboa 1993).
O ex-Ministro da Educação Francês, Luc Ferry, eminente filósofo e ensaísta francês, defensor do humanismo secular, apresenta uma excelente síntese do que está em jogo na forma como o homem se foi relacionando com a natureza e do que subjaz às concepções dessa relação:

«A primeira – sem dúvida a mais banal, mas também a menos dogmática, porque menos doutrinária – parte da ideia de que, através da natureza, é ainda e sempre o homem que se trata de proteger, ainda que seja dele próprio como quando representa o aprendiz de feiticeiro. O ambiente, neste caso, não é dotado de um valor intrínseco.» (...)
«A segunda figura dá um passo no sentido da atribuição de uma significação moral a certos seres não humanos. Consiste em tomar a sério o princípio “utilitarista” segundo o qual é preciso não somente descobrir o interesse próprio dos homens, mas, de um modo mais geral, tender a reduzir ao mínimo o total dos sofrimentos no mundo, assim como a aumentar tanto quanto possível a quantidade de bem-estar. (...) todos os entes susceptíveis de prazer e de dor devem ser tidos por sujeitos de direito e tratados como tal.»
«A terceira forma é a que [se encontra] na reivindicação de um direito das árvores, ou seja, da natureza enquanto tal, designadamente das suas formas vegetal e mineral. (...) já não é o homem, considerado como centro do mundo, que se deve, prioritariamente, proteger de si próprio, mas sim o cosmos enquanto tal que deve ser defendido contra os homens. O ecossistema – a “biosfera” – é, desde logo, investido de um valor intrínseco bem superior ao dessa espécie, afinal de contas razoavelmente prejudicial, que é a espécie humana.» (pp. 25-7)

A crítica filosófica ecologista erigiu-se, pois, contra o humanismo e antropocentrismo da modernidade, arreigando-se em poderosos pensamentos de Heidegger e Hans Jonas e recuperando um certo Espinosa contra Descartes; daí sulcando um caminho, em que, quase “lado a lado”, conservadores e esquerdistas, desde a ecologia nazi (as primeiras leis ecológicas do mundo!) à deep ecology ("ecologia profunda") e ao ecofeminismo, não conseguiram, porém, escapar aos excessos de fé do fundamentalismo verde. A solução passa, segundo argumenta Ferry, por uma shallow ecology (“ecologia superficial” ou “ambientalista”), uma ecologia democrática, que não perca a modernidade humanista, mas antes sulque o caminho da sua perfectibilidade.

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