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Leituras...
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O ex-Ministro da Educação Francês, Luc Ferry, eminente filósofo e ensaísta francês, defensor do humanismo secular, apresenta uma excelente síntese do que está em jogo na forma como o homem se foi relacionando com a natureza e do que subjaz às concepções dessa relação:
«A primeira – sem dúvida a mais banal, mas também a menos dogmática, porque menos doutrinária – parte da ideia de que, através da natureza, é ainda e sempre o homem que se trata de proteger, ainda que seja dele próprio como quando representa o aprendiz de feiticeiro. O ambiente, neste caso, não é dotado de um valor intrínseco.» (...)
«A segunda figura dá um passo no sentido da atribuição de uma significação moral a certos seres não humanos. Consiste em tomar a sério o princípio “utilitarista” segundo o qual é preciso não somente descobrir o interesse próprio dos homens, mas, de um modo mais geral, tender a reduzir ao mínimo o total dos sofrimentos no mundo, assim como a aumentar tanto quanto possível a quantidade de bem-estar. (...) todos os entes susceptíveis de prazer e de dor devem ser tidos por sujeitos de direito e tratados como tal.»
«A terceira forma é a que [se encontra] na reivindicação de um direito das árvores, ou seja, da natureza enquanto tal, designadamente das suas formas vegetal e mineral. (...) já não é o homem, considerado como centro do mundo, que se deve, prioritariamente, proteger de si próprio, mas sim o cosmos enquanto tal que deve ser defendido contra os homens. O ecossistema – a “biosfera” – é, desde logo, investido de um valor intrínseco bem superior ao dessa espécie, afinal de contas razoavelmente prejudicial, que é a espécie humana.» (pp. 25-7)
A crítica filosófica ecologista erigiu-se, pois, contra o humanismo e antropocentrismo da modernidade, arreigando-se em poderosos pensamentos de Heidegger e Hans Jonas e recuperando um certo Espinosa contra Descartes; daí sulcando um caminho, em que, quase “lado a lado”, conservadores e esquerdistas, desde a ecologia nazi (as primeiras leis ecológicas do mundo!) à deep ecology ("ecologia profunda") e ao ecofeminismo, não conseguiram, porém, escapar aos excessos de fé do fundamentalismo verde. A solução passa, segundo argumenta Ferry, por uma shallow ecology (“ecologia superficial” ou “ambientalista”), uma ecologia democrática, que não perca a modernidade humanista, mas antes sulque o caminho da sua perfectibilidade.
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