quarta-feira, 30 de julho de 2008



Fotografias...
“Grão de areia no infinito”
(Figueira da Foz, Julho 2008)
© Miguel Portugal

“Grão de areia no infinito, com avião”

(Figueira da Foz, Julho 2008)
© Miguel Portugal


“Mar solitário”
(Armação de Pêra, Julho 2008)
© Miguel Portugal


“Olhando África”
(Armação de Pêra, Julho 2008)
© Miguel Portugal

quarta-feira, 16 de julho de 2008

Delícias III

Mais uma pequena delícia, que mostra como muitas instituições superiores de formação inicial de professores também se “adaptaram ao mercado” do romantismo e construtivismo ingénuo, tão caros ao ME português e, assim, deram o seu contributo para um verdadeiro estado de surrealismo pedagógico que tem assolado a Escola:

«Uma professora da área de ciências do terceiro ciclo do Ensino Básico (Sintra, 2005) pede aos seus alunos para inventarem uma experiência em que ponham à prova o seu espírito científico. Uma aluna, naturalmente motivada por alguma coisa que ouviu sobre a velocidade da queda dos corpos, resolve fazer experiências para verificar se bolas de diferentes pesos caem de formas diferentes. Faz a experiência com bolas de ping-pong e bolas de ferro e conclui que as segundas caem mais rapidamente. A professora fica muito contente, diz à aluna para apresentar o trabalho num concurso de ciências para jovens e a rapariga apresenta em público os seus resultados. Ora, o que a estudante acabou de fazer foi regredir até Aristóteles (384-322 a.C.). A professora, evidentemente, não conhecia a polémica sobre a queda dos corpos nem a célebre lei da queda dos graves.
No século IV a. C., Aristóteles dizia que os corpos caem tanto mais rapidamente quanto mais pesados são. Quase dois milénios depois, numa série de experiências célebres, muito conhecidas, sobretudo, através do episódio, naturalmente romanceado, da torre inclinada de Pisa, Galileu Galilei (1564-1642) mostrou que os corpos em queda livre caem independentemente do seu peso, e explicou que a observada diferença de velocidades se deve ao atrito, à resistência do ar. [Ver, por exemplo, Stillman Drake, History of Free Fall: Aristotle to Galileo, Toronto, 1989.]
Estas experiências clássicas de Galileu desempenharam um papel na revolução científica que apenas tem paralelo nas conjecturas e observações astronómicas que originaram a revolução heliocêntrica. Evidentemente, a professora nada sabia deste assunto e ajudou a inculcar na aluna e nos seus colegas uma ideia errada que agora custará mais a apagar.
A experiência poderia ter dado resultados altamente positivos se a professora, ao invés de abandonar por completo a aluna, tivesse sabido guiá-la, sugerindo-lhe uma experiência que pudesse levar a conclusões pedagógicas úteis e, finalmente, soubesse criticar os resultados. O ensino experimental em que os jovens devem ser mergulhados deve estar adequado ao tempo, recursos e conhecimentos limitados de que os estudantes dispõem. As experiências pressupõem planeamento e conhecimentos, sobretudo por parte do professor, e não são sinónimo de espontaneidade nem devem ser uma promoção da falta de rigor. Por detrás de tudo isto, além de ignorância científica e pedagógica, está um desrespeito pela ciência e pelo saber e uma extraordinária arrogância. Acreditando, ou fingindo acreditar, que os jovens são capazes de desenvolver um espírito crítico e experimental que se inspira no vazio e não no conhecimento, o romantismo pedagógico quer fazer crer que um jovem, sem preparação de alguma espécie, é capaz de chegar a conclusões científicas que custaram à humanidade muitos anos e muito esforço a conquistar. Este salto de etapas pedagógicas é mais outra manifestação de uma atitude romântica anti-intelectual inspirada no naturalismo de Rousseau.»
In: Nuno Crato, O “Eduquês” em Discurso Directo – Uma crítica da pedagogia romântica e construtivista (Lisboa: Gradiva, 2006) 6ª edição, pp. 87-9.

Sem dúvida que um dos fins do ensino é o desenvolvimento, a um tempo, do espírito criativo e científico. Mas isto… talvez seja demais e, de qualquer modo, pouco contribua efectivamente (talvez, bem pelo contrário) para esse duplo fim!

segunda-feira, 14 de julho de 2008

Mas o Estado é… ladrão?!

A taxa “Robin dos Bosques” sobre os lucros das petrolíferas é um péssimo acto político, pelo menos, pelas seguintes razões:

1. Criando um imposto sobre os lucros das petrolíferas, o governo de José Sócrates dá mais um esquizofrénico passo no sentido de aumentar o intervencionismo do estado na economia – tanto actua como se se tratasse de um governo liberal (tanto na economia como nos costumes), como faz o contrário, espalhando os tentáculos do Estado pela actividade económica e social (vejam-se os tiques totalitários e, por exemplo, a lei da autonomia das escolas, que é completamente ilusória, quando o ME continua a controlar excessiva e desnecessariamente a direcção das escolas). Se o objectivo era (que não parece que seja) redistribuir riqueza para obviar à escalada dos preços dos combustíveis, não seria melhor deixar de arrecadar menos impostos, descendo o ISP (por pouco que fosse), e, assim, permitir um alívio directo sobre o consumidor e enviar um sinal positivo ao mercado, em vez de criar mais um imposto, que parece mais engordar o Estado, do que aliviar a mingua dos indivíduos?

2. Depois, ainda que a medida seja sustentável, do ponto de vista económico, foi maquilhada de um modo altamente reprovável, do ponto de vista ético-político – adornar mais este “pacote” de medidas supostamente salvíficas com a metáfora do “Robin dos Bosques” é transmitir, de modo (no mínimo) completamente irreflectido, a ideia de que o Estado é um ladrão bom(!), que surge como salvador dos pobres explorados pelos ladrões maus (petrolíferas, vulgo geral: “ricos”) que lhes retiram injustamente o pão da boca. Daqui decorrem duas perversas consequências:

2.1. José Sócrates está, não a tentar resolver os problemas reais de uma crise pior do que se possa querer admitir (o que é sumamente mais difícil de fazer, do que assobiar pelo “Robin dos Bosques”!), mas a produzir mais um forte golpe de propaganda eleitoralista, desta feita na tentativa de recolher votos daqueles que sustentam e sentem “na pele” preocupações sociais (a isto chama-se populismo!) e, mais especificamente, de se introduzir inteligentemente no imaginário da esquerda, “roubando” espaço ao PCP e ao BE.

2.2. Tal iniciativa, maquilhada desta forma, faz atolar, escancaradamente, o governo de Sócrates num dos grandes problemas da justiça distributiva, a saber, até que ponto a tributação (pelo menos excessiva) sobre o produto da actividade livre não é precisamente um roubo e, portanto, uma injustiça, como apontam os filósofos e economistas libertários (como Nozick ou Hayek).

2.3. E, at last but not least, está a alimentar irresponsável e despudoradamente a ideia de que o Estado – conjunto de instituições que substituem o estado de luta de todos contra todos (onde a liberdade desregulada geraria violência e, precisamente, actos de furto!) – pode simplesmente roubar a uns, ainda que com a capa da justiça, para dar a outros, quando o Estado é, justamente, pelo contrário, uma forma de organização da sociedade baseada na ordem, nas regras e na defesa das liberdades e garantias dos indivíduos, que actua e faz actuar com base em princípios éticos e não em actos violentos, próprios do indivíduo egoísta que procura satisfazer, por todos os meios, os seus interesses pessoais. Transmite-se, deste modo, a ideia perigosa de que o Estado é impotente para ordenar eticamente a sociedade, introduzindo dúvidas sobre a legitimidade dessa sua fundamental função (“se não vai a bem, vai a mal”!).

Quando um dos entraves ao desenvolvimento – não só económico, mas primeiramente ético e político – do país é a atitude crescente de actuar há margem da lei e da ética contra os outros e contra o Estado (que continuamos a não saber muito bem o que é!), era exigível e não apenas desejável, que o exemplo viesse de cima. Em vez disso, usa-se o “Robin dos Bosques” para ajudar – de modo completamente anacrónico e descontextualizado –, não o “povo”, mas o PS de Sócrates... a ganhar eleições!

sexta-feira, 11 de julho de 2008

Delícias II

Quando, afinal, os resultados da prova de Matemática do 9.º ano, não foram assim tão bons quanto desejável, aqui fica mais uma “delícia” a propósito da matemática da pedagogia romântica e construtivista, que teima em insuflar a pedagogia do ME de Portugal, comentadas por Nuno Crato no seu pequeno, mas esclarecedor livro, O Eduquês em Discurso Directo, que vale sempre a pena revisitar para aclarar ideias:

«”Piaget considera igualmente que os conceitos matemáticos se desenvolvem espontaneamente nas crianças, não havendo necessidade de serem ensinadas directamente pelos professores. No entanto, existe uma parte do conhecimento matemático que é do tipo convencional e terá de ser ensinada.” (Nota de pé de página da autora: “É o caso de todos os símbolos aritméticos […]”.) [Luísa Maria de Almeida Morgado, O Ensino da Aritmética: Perspectiva Construtivista, Coimbra, Almedina, 1993, p. 29.]

Para além do abuso intelectual que é reclamar esta ideia absurda para Piaget, sem qualquer referência aos seus escritos, destaque-se a conclusão deste parágrafo: para respeitar o desenvolvimento da criança, os professores nada lhe devem ensinar de conteúdo matemático. Apenas as convenções gráficas e outras. Pense-se um pouco. Dever-se-á deixá-la descobrir por si própria os números primos, as regras de proporcionalidade e o teorema de Pitágoras?»

In: Nuno Crato, O “Eduquês” em Discurso Directo – Uma crítica da pedagogia romântica e construtivista (Lisboa: Gradiva, 2006) 6ª edição, p. 110.

quinta-feira, 10 de julho de 2008

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Fotografias...



“Ignorância”
(Jardins da A.A.C.; Coimbra, Fev. 2007)
© Miguel Portugal


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Dar a pensar

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«Nunca ninguém teve dúvidas que a verdade e a política estão em bastante más relações, e ninguém, tanto quanto saiba, contou alguma vez a boa-fé no número das virtudes políticas. As mentiras foram sempre consideradas como instrumentos necessários e legítimos, não apenas na profissão de político ou demagogo, mas também na de homem de estado. Por que será assim? E o que é que isso significa no que se refere à natureza e dignidade do domínio político, por um lado, e à natureza e à dignidade da verdade e da boa-fé, por outro? Será da própria essência da verdade ser impotente e da própria essência do poder enganar? E que espécie de realidade possui a verdade se não tem poder no domínio público, o qual, mais do que qualquer outra esfera da vida humana, garante a realidade da existência aos homens que nascem e morrem – quer dizer, seres que sabem que surgiram do não-ser e que voltarão para aí depois de um breve momento? Finalmente, a verdade impotente não será tão desprezível como o poder despreocupado com a verdade?»
Hannah Arendt, Verdade e Política, trad. port. de Manuel Alberto (Lisboa: Relógio d’Agua Ed., 1995) p. 9.

quarta-feira, 9 de julho de 2008

Ministérios da Educação - Ministérios da Propaganda!


Veja-se a crónica de ontem, no Público, de Desidério Murcho, a propósito da qualidade do ensino em Portugal, na qual argumenta no sentido de que não é mais necessário que o ensino seja público para que continue a ser universal, aparecendo a escola privada como o antídoto do futuro, contra os futuros Ministérios da Propaganda, há muito extintos, mas que têm vindo a ser paulatinamente substituídos pelos Ministérios da Educação! (Veja-se também a resposta às críticas à sua crónica.)

Anti-americanismo imprudente

O Ex-Presidente da República, Mário Soares, um anti-americano militante, afirmou – num encontro patrocinado pela Ordem dos Advogados, em que se encontrava presente uma representante da embaixada dos E.U.A. em Portugal – que a prisão Norte-Americana de Guantanamo apenas tem paralelo com os campos de concentração nazi.

Para além do anti-americanismo quase (para não dizer mesmo) primário, revelado no exagero imprudente das declarações proferidas, e do facto de Mário Soares (como, em geral, toda a esquerda, incluindo a socialista, tem tendência para fazer) ter esquecido os massacres de Staline, revelam, sobretudo, um profundo desconhecimento da problemática filosófico-política envolvida nesta questão. (Curiosamente, deve conceder-se a Mário Soares, paradoxalmente, uma das mais bem esclarecidas mentes da política nacional!)

Recentemente, o Supremo Tribunal dos E.U.A. concedeu, e parece-me que bem, direitos iguais aos presos de Guantanamo – privados da sua liberdade com base em suspeitas de participação em actividades terroristas, mas muitos sem terem ainda sido formalmente acusados, e que seriam julgados por um tribunal militar – para poderem recorrer aos tribunais comuns. Esta decisão de reforço dos direitos e liberdades daqueles presos funda-se, em última análise, numa tradição do pensamento político ocidental muito influente nos sistemas políticos contemporâneos, que consiste em defender que a natureza, o âmbito e o objectivo da autoridade política deve ser entendido em relação com a prioridade atribuída à liberdade humana. Desde Maquiavel, Locke, Thomas Paine, J. S. Mill, até Rousseau, Hegel ou T. H. Green e mesmo aos anarquistas e marxistas, que a promoção da liberdade é considerada a finalidade da política. Claro que há diferenças de concepção: em alguns casos é vista como um bem em si mesma, noutros como condição necessária para a realização de outros valores relacionados com o bem-estar humano; alguns (como Rousseau, Hegel ou Green) consideram-na como atributo social, outros (como Locke ou J. S. Mill) concebem-na em termos individualistas.

É esta complexa tradição liberal que dá forma, em boa parte, ao modo como se concebe hoje, nas sociedades democráticas e liberais, o papel da política. É ela que deu origem aos Direitos Humanos, entre os quais se encontra o direito a não ser privado da sua liberdade sem acusação formada. É nela que se ancora a indignação de Mário Soares.

No entanto, o Ex-Presidente da República esquece, para além do facto do poderoso terrorismo, que ameaça justamente as nossas sociedades democráticas liberais, uma outra longa tradição do pensamento político ocidental, que, irremediavelmente, deve aqui ser invocada por ser um outro pilar fundacional do modo como se tem entendido a finalidade da política: a identificação e a manutenção de uma ordem apropriada sempre foram vistas como uma condição prévia necessária para que o Estado organize formas meritórias da existência humana. Com a excepção de marxistas e anarquistas, tem-se pensado que as capacidades coercivas e persuasivas do Estado eram essenciais para a criação da ordem. É claro que podemos vislumbrar concepções “negativas” de ordem: Agostinho, Lutero, Hobbes e os modernos proponentes do governo autoritário (Carlyle, Maurras ou Hitler) defenderam a ordem como meio de reprimir as más acções e ou compensar as deficiências morais e intelectuais de grande parte da população. Mas também podemos encontrar concepções “positivas” de ordem: autores como Platão, Aristóteles, Tomás de Aquino, Rousseau, Hegel e Green defenderam uma conjugação de formas de ordem particulares com a necessidade de estabelecer condições de cooperação, nas quais os seres humanos pudessem prosseguir outros valores fundamentais, designadamente o valor da liberdade!

Ora, no mundo globalizado de hoje a questão da ordem é novamente suscitada como nunca: a tendência para a globalização envolve formas de interacção, interdependência e direcção, que não só vão para além do Estado como ameaçam transcendê-lo. E a ameaça do terrorismo é grotescamente demasiado real para ser esquecida. É neste sentido, que o cosmopolitismo volta a ser encarado com profunda seriedade e pragmatismo, através, designadamente, da concepção teórica em curso de um governo mundial.

Não podemos, pois, esquecer que a defesa da liberdade de suspeitos de terrorismo pode colidir com a liberdade de indivíduos que, não só não são suspeitos de tal crime, como apenas podem viver se tal crime não for perpetrado (pense-se nisto!). Para tal, não podemos afastar-nos muito de uma forma “positiva” de encarar a ordem como meio do Estado poder proporcionar condições necessárias para poderem ser vividos pelos indivíduos outros valores, tais como a fundamental liberdade.

terça-feira, 8 de julho de 2008

Delícias I

A propósito da polémica em torno dos “estranhos” exames de Matemática (e Português!) e da pedagogia construtivista ingénua que tem envolvido, nas últimas décadas, as (des)orientações do ME, não resisto a partilhar algumas análises críticas que Nuno Crato faz de textos supostamente científico-pedagógicos dos educadores de Portugal:

«Vejamos extractos de um livro dedicado à preparação de professores do ensino básico e muito recomendado em Escolas Superiores de Educação. A autora apresenta-se desde o início como apoiante da perspectiva construtivista, que explicitamente reconhece inspirar os fundamentos do programa de matemática do 1.º ciclo (1990).

“O papel do professor não é pois o de transmitir ideias feitas aos alunos mas de os ajudar, através das tarefas apresentadas, a construir os seus próprios conhecimentos. (…) Sendo assim, o professor deverá respeitar sempre a opinião do aluno e, mesmo quando esta é incorrecta, evitará emitir sobre esta juízos de valor.” [Luísa Maria de Almeida Morgado, O Ensino da Aritmética: Perspectiva Construtivista, Coimbra, Almedina, 1993, p. 25.]

Curiosa esta designação para conhecimento: “ideias feitas”… Mais uma vez, parece sensato que o ensino não seja a transmissão de preconceitos. As não devem os professores transmitir aos alunos a “ideia feita” de que a República foi implantada em 1910, nem a “ideia feita” de que um triângulo tem três vértices? E devem “evitar emitir juízos de valor”? A classificação de certo ou errado não constitui um juízo de valor? Deve ser evitada pelo docente? É isso que quer dizer “respeitar sempre a opinião do aluno”? Pelos vistos, há quem o defenda e dê significado dogmático ao apelo ao “respeito”.»

In: Nuno Crato, O “Eduquês” em Discurso Directo – Uma crítica da pedagogia romântica e construtivista (Lisboa: Gradiva, 2006) 9ª edição, pp. 109-110.

segunda-feira, 7 de julho de 2008

A verdade matemática!

As médias dos resultados obtidos pelos alunos portugueses nos exames nacionais de Matemática A (Cursos Científico-Tecnológicos) no final do 12.º ano de escolaridade, nos últimos cinco anos, foram as seguintes:

2004 – 8,6 valores
2005 – 8,1 valores
2006 – 8,1 valores
2007 – 10,6 valores
2008 – 14,0 valores
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As taxas de reprovação no exame à mesma disciplina, nos últimos três anos, foram as seguintes:
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2006 - 29%
2007 - 18%
2008 - 7%

O ME adiantou que tal evolução nos resultados se ficou a dever ao maior empenho dos alunos, que estudaram mais, dos professores, que ensinaram melhor, e ao facto de ter sido concedido mais tempo para realizar os exames.

A questão que se coloca é a de saber se a melhoria dos resultados se deve, efectivamente, ao facto dos alunos terem, de um ano para o outro (de 2006 para 2007 e, sobretudo, de 2007 para 2008), estudado e aprendido mais e ao facto dos professores terem passado, de um ano para o outro, a ensinar mais e melhor. Ou seja, mais precisamente: poderemos servir-nos destes exames realizados ao longo destes anos, para saber se os alunos sabem realmente mais Matemática?

O argumento que tem sido verbalizado pelo Matemático Nuno Crato, Presidente da Sociedade Portuguesa de Matemática (SPM), é o de que, com base nestes dados, não podemos saber realmente isso, uma vez que: tem variado a estrutura dos exames ao longo dos anos; tem variado o tipo de questões formuladas; tem variado (tendencialmente, desde o ano passado, decrescido, principalmente este ano) o grau de dificuldade; têm variado os critérios de correcção das provas; tem variado o tempo de duração das provas (este ano acresceu mais 30 minutos!). Com todas estas variações, não mantendo um padrão mais ou menos coerente na forma como se testam e avaliam conhecimentos e competências, não é de todo possível extrair qualquer conclusão cientificamente fidedigna ou objectiva, a partir destes instrumentos mal elaborados, sobre a evolução das aprendizagens dos alunos na disciplina de Matemática.

É claro que toda a gente(?!) gostaria que os resultados nas provas da disciplina-rainha do sistema das ciências da era moderna, que os alunos das escolas portuguesas obtivessem, fossem, efectivamente, um espelho mais real das suas aprendizagens e, portanto, um verdadeiro auxílio inestimável para as suas vidas futuras. É claro também que a SPM e outros críticos, como a Associação de Professores de Matemática (APM) assumem, com algum natural regozijo, que tem havido uma preocupação do ME em alterar o ainda “mau estado” do desempenho matemático dos nossos alunos, designadamente através do Plano de Acção para a Matemática. Mas, de facto, este plano, como alertou hoje a APM, não abrangeu estes alunos do 12.º ano (iniciou-se para os alunos do 9.º ano em 2006/2007), pelo que não poderia ser um factor responsável por estes resultados. E depois não podemos fazer uma correlação directa entre os resultados nestes exames, com todas as variações descritas, e o que eles deveriam, pelo menos em parte (tanto quanto é possível), avaliar, que eram os conhecimentos e competências que os alunos efectivamente dispõem no final de um ciclo crucial de aprendizagens.

Além do mais, sabe-se que as reformas introduzidas num qualquer sistema de ensino demoram a ter resultados fiáveis. O único estudo credível, que compara os desempenhos matemáticos de alunos de vários países em todo o mundo (o PISA, da OCDE), mostra que, de 2003 para 2006 (últimos dois estudos efectuados), o desempenho dos alunos portugueses teve uma oscilação muitíssimo menor do que aquela que o ME quer atribuir com base nestes exames nacionais, com as deficiências científico-pedagógicas apontadas.

Portanto, fazer crer que estes resultados nestes exames espelham conhecimentos e competências matemáticas efectivamente adquiridas pelos alunos e que isso é o resultado das imperfectíveis políticas educativas de suposto sucesso implementadas pelo ME, conduzido por Maria de Lurdes Rodrigues, é demasiado falso para parecer ser verdade.

A “verdade matemática” é evidente. As consequências políticas não o são menos.

sexta-feira, 4 de julho de 2008

Quando a Escola deixar de ser Escola

Maria Filomena Mónica escreve mais um texto imperdível, a propósito dos exames de Português, na elaboração do qual teve a oportunidade de se deleitar (e connosco partilhar) com algumas das monumentais (des)construções pseudo-científico-pedagógicas que brotam dos doutos autores de programas, exames e critérios de correcção dos mesmos, que têm vivido extraordinários anos de fecunda emoção intelectual no Mi(ni)stério da Educação de Portugal. Sim, é verdade: a doença do romantismo rousseauniano e do construtivismo ingénuo (vulgo "eduquês") ainda vai (des)orientando o ensino em Portugal. (Não é por acaso que as fontes bibliográficas de que suas exas. se munem para fabricar excelsas obras programáticas, muitas delas compostas de citações de citações, são maioritariamente em língua gaulesa, e bem menos em língua inglesa! É que os autores anglo-saxónicos ainda contaminados por este tique de pseudo-cientificidade pedagógica, são bem menos, estando o grosso da inteligência, sobretudo em terras do Tio Sam, a fazer arreigar, já há muito, o estudo da pedagogia em psicologia experimental e não na bela citação de citação, que tantos doctor mirabilis tem diplomado por essas universidades fora!).

O texto de opinião de MFM, publicado no Público, é um crítico mas informado grito de revolta diante de uma escola vergonhosamente ao serviço da propaganda de um governo constituído por pessoas que dão mostras de uma grotesca falta de capacidade moral para ocupar cargos públicos, quando usam um dos bens, senão o bem mais valioso de que a humanidade talvez tenha à sua disposição enquanto espécie, que é a educação das crianças e jovens, para fazer inculcar ideologia de poder (que é, entre outras, a ideologia da facilidade contra o esforço), para manipular consciências, para aniquilar competências críticas e autónomas, tudo isto a arrepio das válidas chamadas de atenção da inteligência, dos intelectuais, de uma elite cada vez mais arredada da sua função de contribuição para auxiliar na orientação da sociedade.

A ME, Maria de Lurdes Rodrigues (que até tentou fazer algumas reformas necessárias), arrisca-se não só a vir a ser lembrada como a que mais tempo conseguiu ocupar o cargo, mas também como aquela que pode ter dado uma das mais contundentes machadadas na Escola enquanto Escola em Portugal. Só mesmo os professores mais pacientes e imbuídos do espírito de missão humanista subjacente ao munus de ensinar a ser humano, com grande esforço de luta contra os problemas educacionais, mas também contra as directrizes ministeriais, muitas delas perfeitamente aberrantes (faça-se o favor de consultar programas e outros documentos provenientes da 5 de Outubro!), é que têm vindo a evitar o completo aniquilamento de uma instituição escolar, cujos problemas, ao invés de terem sido enfrentados por este governo, foram mascarados, apedrejados de paralisante retórica e, pura e simplesmente, num acto de gritante irresponsabilidade, atirados para a frente.

Quando a Escola deixar de ser Escola... passará a ser (quando já não o é, em muitos casos!) um local surrealista onde se fará de conta que os meninos, não podendo ser de ouro, se contentarão em serem eternamente bons selvagens! Até um dia...

quarta-feira, 2 de julho de 2008

As tropelias dos meninos de ouro

Na passada semana, quando Margarida Moreira, Directora Regional de Educação do Norte, terá dito que «talvez fosse útil excluir de correctores aqueles professores que têm repetidamente classificações muito distantes da média», «os alunos têm direito a ter sucesso» e o que «honra o trabalho do professor é o sucesso dos alunos» estava simplesmente a dar cumprimento a uma política, explícita ou implicitamente dimanada de Lisboa, de facilitação de obtenção de resultados em provas de aferição e exames nacionais.
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Claro que a capa, que esconde esta hedionda perversidade, consiste em dizer, como disse Carlos Pinto Ferreira do GAVE (Gabinete de Avaliação Educacional), que se trata apenas de chamar a atenção para o dever dos professores correctores elaborarem o seu trabalho seguindo estritamente os critérios de correcção das provas emanadas daquele gabinete. Mas esta prerrogativa não é óbvia?! É claro que não seria necessário vir ninguém dizer a um juiz ou a um médico que devem seguir estritamente as normas e as boas práticas instituídas no decurso dos seus importantes trabalhos, a não ser que tais profissionais não estivessem, de todo, a fazê-lo. E se fosse esse o caso, teriam que se apurar os factos e proceder disciplinarmente em conformidade com a lei.

Ora, não é isto que está aqui em causa. Não há inquéritos de apuramento de factos (exames mal corrigidos por professores), nem há procedimentos disciplinares, que se saiba, a professores correctores por não terem seguido as normas na correcção de exames. Portanto, o que está aqui em causa, para quem quiser ver, é uma intromissão (mesmo que indirecta, via DREN) ilegítima do governo na verdade educacional, designadamente, na correcção de provas de aferição e exames de conhecimentos e competências, coisas a que o Estado só acede directamente caso se trate de um Estado totalitário; num estado verdadeiramente democrático existe uma clara separação entre política e ciência, entre poder e verdade educacional.
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Este governo já mostrou que todos os fins justificam quaisquer meios. (O Ministro da Economia até já vai, numa das iniciativas mais ridículas que até hoje algum membro de um governo de um país desenvolvido já fez, aos hiper-mercados mostrar que os preços, apesar de não estarem mais baixos, estão mais baixos!) No caso da educação, interessa que haja resultados, já! É realmente mais difícil (embora não impossível) enfrentar politicamente os problemas sócio-económicos e culturais que estão por detrás do ainda mau desempenho de muitos alunos portugueses, designadamente, na língua e cultura materna e na Matemática. Como esse caminho não seria tão fácil e tão rápido é melhor enveredar pelo populismo da facilidade. A mensagem (qual Fernando Pessoa, desta feita, de "ouro") é: não se esforcem; os professores é que corrigem mal!
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Mesmo que os nossos jovens não aprendam grande coisa nem desenvolvam grandemente as suas competências, cada vez mais necessárias num mundo altamente exigente em (verdadeiras) qualificações, o que é preciso é que os seus pais votem para manter o poder. (E se muitos pais, coitados, ficam, mesmo que virtual e ilusoriamente, contentes com isto...!)

Com as eleições à porta e uma oposição a erigir-se paulatinamente com segura fortaleza preparemo-nos para mais tropelias dos meninos de ouro!