quinta-feira, 8 de maio de 2008

Tuberculose, comunicação social e política

Mirandela, Trás-os-Montes, Portugal... União Europeia. Ano de 2008. Perante alguns casos de tuberculose pulmonar (contagiosa) em escolas do concelho, a Delegação Regional de Saúde procede, num jardim-de-infância, em Novembro de 2007, a rastreio em adultos e crianças. Foi, entretanto, detectado um caso num adulto daquele jardim-de-infância.

O Agrupamento de Escolas não comunicou absolutamente nada aos pais, alegando o Conselho Executivo não ter tido conhecimento do que se estaria a passar (apenas mais tarde ficou a saber) e as próprias educadoras julgaram, inicialmente, tratar-se de mais uma acção clínico-pedagógica, como outras, ao abrigo de protocolos com o Centro de Saúde da cidade. O Agrupamento não terá tido, alegadamente, conhecimento que havia casos de tuberculose em algumas das suas escolas (para além daquele jardim-de-infância), nem que equipas médicas iriam proceder a testes de tuberculina em jardins-de-infância e escolas do primeiro ciclo, porque… o comunicado da Delegação de Saúde foi enviado para a Câmara Municipal e, nesta, pressupôs-se (e parece-me que bem!) que também teria sido dado conhecimento ao Conselho Executivo do Agrupamento! Alegadamente, não foi!!

Entretanto, quando o Conselho Executivo do Agrupamento veio a saber que havia casos de tuberculose em algumas das suas escolas, incluindo num dos seus jardins-de-infância, sugeriu à Delegação de Saúde local que se promovesse uma sessão de esclarecimento aos pais e encarregados de educação das crianças (alguns – os que sabiam – já preocupados), ao que lhes terá sido respondido “que boa ideia, ainda não nos tinha ocorrido”, mas terão alegado qualquer coisa genérica como ainda não terem condições para realizar tal sessão!

Sabe-se lá porquê(!), os órgãos de comunicação social, coisa estranha e inédita(!), vieram a obter a informação dos casos de tuberculose, já no adiantado mês de Abril de 2008, designadamente num jardim-de-infância da cidade. Alguns pais ficaram, então, a saber que os seus filhos estavam a frequentar uma escola em que uma funcionária se encontrava de baixa médica, desde Janeiro, por lhe ter sido diagnosticada tuberculose pulmonar e que tinham sido alvo de testes de tuberculina… através das notícias dos órgãos de comunicação social, designadamente através de reportagens televisivas e isto, portanto, em Abril de 2008!
Apenas sob pressão efectiva de alguns pais e, (infelizmente) principalmente, sob a pressão da tão incómoda comunicação social acabou por se realizar, em 7 de Maio (ontem!), uma sessão de esclarecimento sobre tuberculose, em que estiveram presentes o Delegado de Saúde de Mirandela o Adjunto do Delegado Regional de Saúde e mais dois médicos.

Esta sessão de esclarecimento permitiu esclarecer:

1. que talvez tenham sido tomadas todas as medidas clinicamente previstas para tratar, prevenir e despistar casos de tuberculose pulmonar e que talvez seja mesmo seguro manter as crianças naquele ambiente, que até talvez seja mesmo privilegiado, uma vez que está a ser monitorizado;

2. que foi, contudo, sonegada informação fundamental aos pais – primeiros e maiores responsáveis pela educação, segurança e saúde dos seus filhos menores –, durante 5 meses, tornando assim impossível uma legítima e importante tomada de decisão de forma livre e, portanto, responsável, independentemente de qual fosse.

3. que as instituições responsáveis pela administração da política de saúde, pelo menos local e na região Norte (será só aqui?!), não estão minimamente preparadas, do ponto de vista organizacional, para produzir decisões politicamente modernas, que privilegiam efectivamente os valores ético-políticos mais fundamentais das sociedades democráticas-liberais, que é o que a nossa quer ser(?!), como seja o da igualdade de acesso a informação relevante acerca de menores ao cuidado dessas mesmas instituições;
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4. que as pessoas que ocupam lugares públicos, portanto com uma inegável dimensão política – como sejam as de delegados de saúde – demonstraram não ter sensibilidade e preparação política para tomar decisões verdadeiramente competentes (do ponto de vista político) acerca de um caso de saúde pública numa escola, designadamente num jardim-de-infância, que passaria por uma informação de qualidade técnica e atempada;
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5. que se continua a fazer política (porque os delegados de saúde, desde o regional ao local, são cargos políticos!) como se fazia há 40 anos atrás, tratando-se os cidadãos como se de atrasados mentais se tratasse, abusando de um paternalismo perfeitamente pacóvio e provinciano, como se as instituições estatais tivessem que tomar todas as decisões pelos cidadãos livres (característica, isso sim, de países do chamado terceiro mundo, sob sistemas políticos totalitários!).
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6. que continua a fazer-se em Portugal uma política de pura e simples propaganda de um governo que não pode ter mácula (como isso fosse, sequer em tese, possível!), que teima em governar impondo e ocultando, na fria distância da sua maioria absoluta, confundindo maioria absoluta com poder absoluto;
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7. e que (coisa perfeitamente inacreditável!) as pessoas que ocupam cargos públicos continuam, inexplicavelmente, a não saber lidar com a comunicação social, quando, neste infeliz caso teria sido muito mais dignificante para governadores e governados, se se tivesse evitado o pânico e a telenovela sempre produzida pelos órgãos de comunicação social usando e abusando da vida privada das pessoas, antecipando a sua entrada em cena, retirando-lhe completamente a oportunidade de criar mais uma sensacionalista "notícia";
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8. Que, desgraçadamente para quem ocupa cargos públicos, mais uma vez é no palco e sob a batuta da comunicação social que se cava o fosso entre a política e os cidadãos;
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9. Que a confiança que os cidadãos têm nas instituições estatais continua a decrescer graças à inacreditável falta de competência, sensibilidade e formação política de pessoas que ocupam cargos públicos demasiado importantes na vida das pessoas;
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10. E que, consequentemente, há quem continue a contribuir para o atoleiro das mentalidades e do modus operandi da sociedade portuguesa em direcção a um terceiro-mundismo altamente preocupante.

Como evitar tudo isto? Era só e apenas ter informado, esclarecido e aconselhado os pais daquelas crianças... ATEMPADAMENTE!!!

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