segunda-feira, 30 de junho de 2008

Parabéns aos nuestros hermanos!

Afinal, ganhou o futebol espectáculo espanhól, pleno de técnica e emoção, que proporciona algum prazer para quem assiste, de uma equipa verdadeiramente empenhada em jogar como tal e competir com a camisola do seu país. Perdeu o calculismo pragmatista e frio de uma equipa alemã que joga (quando lho consentem e o consegue) em busca do erro do adversário, mas que, apesar de ser sempre uma grande equipa do futebol mundial e de ter chegado à final deste Euro 2008, não proporciona, de facto, espectáculo nada agradável para quem deseja deleitar-se um pouco com o desporto rei.
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As emoções são isto mesmo – até nos fazem sentir ibéricos! (Talvez até haja mais razões para tal.)


Fotografias...



“Perfis com nuvens”
(Muralhas do Castelo de Bragança; Maio 2008)
© Miguel Portugal

quinta-feira, 26 de junho de 2008

Mais falácias, senhora Ministra!

A ME, Maria de Lurdes Rodrigues, reagiu às críticas aos exames, designadamente de Matemática, negando que haja facilitismo, alegando que as críticas são meros alarmismos e oportunismos políticos e - no seu habitual tom acusatório completamente despropositado - que os professores sempre gostaram muito de polémicas acerca de exames (veja-se, por ex., edição em papel, de ontem, do JN, p. 8)! Quando não há razões objectivas e, portanto, válidas para contra-argumentar é mais fácil acusar os críticos... de serem críticos! Ora, isto é aquilo que em lógica informal se chama um argumento ad hominem: em vez de se "atacarem" as ideias, atacam-se as próprias pessoas, nalgum suposto defeito que possam, alegadamente, possuir, mas, de qualquer modo, irrelevante para apreciar as suas ideias - o que constitui um argumento falacioso (i.e., inválido, embora apresentado de modo a parecer válido).

Talvez fosse bom que, de uma vez por todas, as pessoas que ocupam cargos governativos (leia-se: de alta responsabilidade pública) começassem a ter o devido respeito pelos agentes da sociedade civil, que, com o seu saber, competência e dedicação, contribuem verdadeiramente (sempre que lhes é permito, claro!) para o real desenvolvimento (possível) da sociedade! É que os professores não só têm o direito mas também o dever de se empenharem em fazer prevalecer as condições necessárias (e suficientes) para fazer prevalecer a verdade educacional, como, por exemplo, os juízes e advogados têm o direito e o dever de se empenharem em fazer prevalecer as condições necessárias para que se possa fazer justiça. Ora, não se conhece forma de o fazer que não envolva uma boa dose de espírito crítico! Portanto, é bom para qualquer sociedade (que os governos justos governam) que os professores sejam críticos relativamente a tudo quanto lhes pareça que possa colocar em causa esse valor fundamental, que é a verdade educacional.

Afinal, uma classe docente com espírito crítico é uma das boas coisas que um ME de um país civilizado e desenvolvido deveria desejar! Ou será que não?!

terça-feira, 24 de junho de 2008

Afinal, a Matemática… é fácil!!

Os alunos do 12.º ano realizaram ontem o exame nacional de Matemática. Ao que parece, foi fácil, tal como o exame do 9.º ano, demasiado fácil! Os resultados dos exames à disciplina-rainha do mundo do saber científico e tecnológico, em geral muito baixos no nosso país, têm melhorado nos últimos três anos. A questão é saber se por força de uma melhoria efectiva nas aprendizagens de conhecimentos e competências da Matemática ou se por um abaixamento do nível de exigência dos exames nacionais que os deveriam testar. A questão é levantada pela SPM (Sociedade Portuguesa de Matemática; veja-se aqui a análise que a SPM faz do exame de Matemática do 12.º ano), que invoca, na argumentação de Nuno Crato, o estudo da OCDE (o mais credível a nível mundial) para avaliar conhecimentos e competências – o PISA –, o qual mostra que Portugal não só não está efectivamente a evoluir, como está ainda aquém de resultados satisfatórios para um país que se deseja em desenvolvimento (veja-se aqui).

Mas, para que serve, afinal, um exame de conhecimentos e competências? Serve para três coisas:

1. Serve para, no final de um percurso de aprendizagem, avaliar os conhecimentos e competências obtidos;

2. Serve para incrementar o esforço, a dedicação e responsabilidade, ao longo do processo de aprendizagem de quem quer apreender um conjunto de conhecimentos e competências;

3. Serve para, no final de um percurso de ensino, avaliar o trabalho docente desenvolvido, já que parte do resultado obtido (embora nunca, talvez infelizmente, “todo” o resultado) depende da forma como o professor fez com que o aluno apreendesse, ao longo do percurso, os conhecimentos e competências requeridas.

Assim, o professor deve seguir uma lei programática que dita as competências e os conhecimentos que o aluno, no final de determinado ano ou ciclo de ensino, deve atingir. Quando, no final de um processo de ensino-aprendizagem, o exame nacional de avaliação de conhecimentos e competências, produzido, supostamente, pela mesma pena que produziu o programa, não se funda na exigência ou pressuposto dos mesmos conhecimentos e competências, então é um exame mal elaborado, não cumprindo minimamente a sua função essencial. Essa discrepância constitui, pois, uma falha técnica na elaboração do mesmo, que existe quer se o exame exigir mais do que estava programado, quer se exigir menos do que estava programado. Portanto, o exame de Matemática em análise acaba por não conseguir escapar a esta crítica.

Por outro lado, apresentar, no final de um ano naturalmente exigente (e cuja cultura escolar já tinha consagrado, muito natural e consensualmente, como tal), um exame de conhecimentos e competências injustificadamente fácil é colocar em causa todo um trabalho de rigor e exigência no processo de ensino-aprendizagem e sua avaliação, desenvolvido, ao longo de três anos, por professores empenhados na árdua tarefa de ensinar e fazer aprender Matemática. Se tomarmos em conta os resultados dos exames de Matemática dos últimos três anos, isso quer dizer que o trabalho, em geral, dos professores de Matemática tem sido eficaz no modo como têm feito os alunos aprenderem Matemática ou terão sido antes os resultados naturalmente melhorados pelo decaimento do nível de exigência na testagem de efectivos conhecimentos e competências matemáticas por via do exame nacional? E se os processos de avaliação de conhecimentos utilizados pelos professores forem, em geral, mais rigorosos que o próprio exame nacional – com aquelas falhas técnicas apontadas –, isso significa que são esses processos que estão errados ou será antes o exame que se encontra desajustado face à sua função?

Mas o problema não se fica pela falha técnica, nem pelo desrespeito pelo trabalho de muitos professores (embora não por todos, naturalmente) ou pelo completo falhanço do exame enquanto instrumento de avaliação externa. O problema é que o ME, ao criar exames demasiado facilitadores – não das aprendizagens, mas da obtenção de resultados (que é bem diferente) –, acaba por ser o primeiro responsável pela difusão, já hoje bem notória e generalizada para quem vive o seu quotidiano numa escola, de uma atitude altamente permissivista e facilitista, que é, obviamente, muito negativa para a formação das pessoas dos alunos, bem como para a difícil fase de desenvolvimento do país.

Quando se deveria exigir qualidade, facilita-se; quando se deveria exigir verdade, mascara-se; quando difícil é mudar realmente, altera-se artificialmente. Mas nem todos compreenderão estas análises críticas e, por isso, é muito natural que a estratégia política deste governo – em ante-vésperas de eleições e agora com oposição que se começa a fortalecer – convença muitos incautos, eles próprios já contaminados por esta cultura política demagógica e altamente propagandística da facilidade das leituras de curto prazo, com estatísticas embriagadoras a ajudar.

sexta-feira, 20 de junho de 2008

A incompetência por cá continua

O Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) fez, recentemente, um périplo por escolas do país, no intuito de realizar acções de sensibilização da população estudantil a propósito do flagelo do tráfico de seres humanos.

À partida, uma iniciativa naturalmente notável. No entanto, numa sessão a que pude assistir com alunos, encontrei dois indivíduos a procurar cumprir uma missão para a qual não se mostraram nada preparados, nem empenhados: um, sentado, com o cotovelo cravado numa mesa a segurar a cabeça, com ar de profundo enfado; o outro, a decifrar a custo uma apresentação em PowerPoint, naturalmente não concebida por ele, a partir da qual lá foi, a espaços, balbuciando algumas explicações do fenómeno e acções preventivas a empreender.

A cereja sobre o bolo veio com a distribuição de um pequeno livrinho em banda desenhada (numa tradução portuguesa), cuja contracapa vinha ornamentada com uma surpreendente errata auto-colada:

“Na página 01, onde se lê Concelho deve ler-se Conselho.”

A sra. Inspectora Superior do CIF/SEF, Luísa Maia Gonçalves, que surge como coordenadora do projecto, deveria ter tido outro cuidado, para além de permitir uma simples apostagem de uma errata, diante de erro ortográfico completamente inadmissível, numa era em que os correctores electrónicos até já substituem a gramática da língua de quem não a possui!

Numa altura em que já se vai percebendo, de modo mais alargado (embora não tão generalizado quanto seria de desejar!), que o empenhamento, a dedicação, a competência e a exigência de qualidade no desempenho profissional são condições necessárias para o adequado desenvolvimento do país, seria de esperar que tais prerrogativas também (ou sobretudo) atingissem organismos do Estado.

É claro que aquelas pessoas não detinham as qualificações e competências adequadas para fazer aquele trabalho de exigência pedagógica. Mas não podemos continuar a cumprir calendário/horário apenas para um povo supostamente ignorante ver. Quando o assunto for sério (como era o caso) e se pretender fazer um trabalho de divulgação, que envolve preparação científico-técnica e qualidades comunicacionais, numa escola, talvez fosse boa ideia ir começando a pensar que, mesmo nas escolas portuguesas, lá se vai encontrar massa crítica, competência comunicacional e cultura de cidadania suficientes para exigir uma outra preparação por parte de quem protagonizar semelhantes acções. Não será melhor avaliar também o desempenho de outros agentes públicos?!

quinta-feira, 19 de junho de 2008


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Dar a pensar...


«Após o assassínio de dois distintos holandeses, o político Pim Fortuyn em 2002 e o realizador Theo van Gogh em 2004, por extremistas islâmicos como retaliação às suas críticas ao Islão, dois membros do parlamento holandês foram forçados a viver em instalações secretas sob pesada protecção. Um deles, Geert Wilders, tem vivido numa cela de prisão; o outro, Ayaan Hirsi Ali, está confinado a uma base militar. Ambos receberam várias ameaças de morte. Quais são os seus crimes? Criticaram o islamismo extremista, nomeadamente, o tipo de extremismo que levou à morte de Fortuyn e Van Gogh e que os ameaçou a eles de morte. A ironia da sociedade liberal ocidental é que tem de restrigir a liberdade e esconder pessoas inocentes que exerceram o direito à liberdade de expressão, enquanto que aqueles que iriam destruir a nossa liberdade têm as suas liberdades protegidas, de tal modo que andam pelas ruas das nossas cidades e é-lhes permitida ampla oportunidade para exercer actos de violência.»

Louis Pojman, Terrorism, Human Rights, and the Case for World Government (2006), trad. Célia Teixeira, Terrorismo, Direitos Humanos e a Apologia do Governo Mundial (Lisboa: Ed. Bizâncio, 2007) 45-6.

terça-feira, 17 de junho de 2008


Leituras…


…muito úteis e proveitosas podem ser as de António José Fernandes, Introdução à Ciência Política – teorias, métodos e temáticas (Porto: Porto Editora, 2008). Trata-se de uma introdução equilibrada e acessível à Ciência Política, em que o autor, natural de Múrias, Mirandela, Professor Catedrático da Universidade do Minho (aposentado) e em exercício na Universidade Lusófona do Porto (onde ocupa, desde 2005, o cargo de Reitor), especialista nesta área do saber, que consiste na «observação, análise, comparação, sistematização e explicação dos factos e acontecimentos políticos» (p. 12), propõe uma explanação, com sentido pedagógico, dos principais problemas da ciência política, esclarecendo os seus conceitos nucleares e apresentando as suas principais teorias.

Com o intuito de ser lido por estudiosos que procuram uma abordagem sistemática das temáticas da ciência política, o seu cariz pedagógico coloca-o, no entanto, também à disposição de qualquer leitor interessado em enriquecer a sua cultura de cidadania.

O seu carácter de manual (de “trazer à mão”) permite, assim, consultas fáceis e introduções eficazes a temas como: o conceito, formação e evolução do Estado; os elementos do Estado (povo, nação, território, aparelho do poder); categorias de Estados (não soberanos, semi-soberanos e soberanos); fins e funções dos Estados; os órgãos da direcção do Estado; regimes políticos; grupos de interesse e grupos de pressão; sistemas de partidos; sistemas eleitorais; terminando com uma abordagem sobre as concepções ideológicas de poder.

Há mais vida para além da política; o que quer dizer, porém, que também a há para aquém – e talvez seja mesmo esta, para o bem e para o mal, uma parte da vida mais fundacional, a partir da qual se pode erigir, melhor ou pior, uma vida verdadeiramente humana, livre e justa. Não há como estar consciente, atento e esclarecido acerca desse alicerce.

segunda-feira, 16 de junho de 2008

A “fraqueza” do futebol numa Suíça fortemente atractiva para se viver

Ontem, durante o jogo do Euro 2008 Portugal-Suiça, um comentador de uma televisão portuguesa criticava as condições infra-estruturais que a Suíça apresentava para este Campeonato Europeu: num dos estádios onde decorre o Euro, os jornalistas até têm, para se deslocarem do centro de imprensa até ao estádio, de atravessar uma linha de comboio e uma avenida; “em Portugal não havia um estádio em que isso acontecesse!”, ironizavam. Conclusão?! A Suíça parece ser um país menos desenvolvido que Portugal, já que organiza um campeonato europeu de futebol sem ter construído estádios de raiz, com as excepcionais e condigníssimas condições, absolutamente indispensáveis para uma actividade de transcendente importância!

Talvez seja até verdade que, para um país como Portugal ter condições para ganhar uma organização de um campeonato europeu de futebol, como foi em 2004, seja necessário mais do que a Suíça teria, à partida para oferecer, tendo que aparecer infra-estruturas grandiosas para atrair os decisores da UEFA.

Mas mais importante do que este pormenor (não é líquido que Portugal tenha obrigatoriamente que ter delapidado erário público para tantas e tamanhas obras futebolísticas, com as melhores condições do mundo para o desenrolar de um campeonato como aquele) importa salientar que muitas pessoas em Portugal continuam, infelizmente, a pensar que o desenvolvimento de um país e as condições de vida das pessoas se medem pelo futebol. Se aqueles jornalistas, que proferiram aquela crítica, tivessem pensado um pouco mais e olhado um pouco à sua volta (para além do estreito mundo futebolístico) teriam, com certeza, constatado como a Suíça, apesar de não ter grandes estádios de futebol, tem infra-estruturas estatais e uma organização social capaz de conceder um bom sistema de saúde, um bom sistema de ensino, de justiça e, em suma, uma vida boa a todos aqueles que aí queiram viver e trabalhar, ao contrário do que acontece, de facto, no nosso país!

Como Portugal cresceria – para benefício de todos – se o nosso mundo crescesse para além do futebol, uma de entre muitas das actividades com as quais o ser humano pode preencher a sua existência, embora não, obviamente, a mais fundamental.

sexta-feira, 13 de junho de 2008

Há 120 anos nascia Fernando Pessoa

«Ode Triunfal

(…)

Ó fazendas nas montras! Ó manequins! Ó últimos figurinos!
Ó artigos inúteis que toda a gente quer comprar!
Olá grandes armazéns com várias secções!
Olá anúncios eléctricos que vêm e estão e desaparecem!
Olá tudo com que hoje se constrói, com que hoje se é diferente de ontem!
Eh, cimento armado, beton de cimento, novos processos!
Progressos dos armamentos gloriosamente mortíferos!
Couraças, canhões, metralhadoras, submarinos, aeroplanos!

Amo-vos a todos, a tudo, como uma fera.
Amo-vos carnivoramente,
Pervertidamente e enroscando a minha vista
Em vós, ó coisas grandes, banais, úteis, inúteis,
Ó coisas tantas modernas,
Ó minhas contemporâneas, forma actual e próxima
Do sistema imediato do Universo!
Nova Revelação metálica e dinâmica de Deus!

Ó fábricas, ó laboratórios, ó music-halls, ó Luna-Parks,
Ó couraçados, ó pontes, ó docas flutuantes –
Na minha mente turbulenta e encandescida
Possuo-vos como a uma mulher bela,
Completamente vos possuo como uma mulher bela que não se ama,
Que se encontra casualmente e se acha interessantíssima.

Eh-lá-hô fachadas das grandes lojas!
Eh-lá-hô elevadores dos grandes edifícios!
Eh-lá-hô recomposições ministeriais!
Parlamentos, políticas, relatores de orçamentos,
Orçamentos falsificados!
(Um orçamento é tão natural como uma árvore
E um parlamento tão belo como uma borboleta).

Eh-lá o interesse por tudo na vida,
Porque tudo é a vida, desde os brilhantes nas montras
Até à noite ponte misteriosa entre os astros
E o mar antigo e solene, lavando as costas
E sendo misteriosamente o mesmo
Que era quando Platão era realmente Platão
Na sua presença real e na sua carne com alma dentro,
E falava com Aristóteles, que havia de não ser discípulo dele.

Eu podia morrer triturado por um motor
Com o sentimento de deliciosa entrega duma mulher possuída.
Atirem-me para dentro das fornalhas!
Metam-me debaixo dos comboios!
Espanquem-me a bordo de navios!
Masoquismo através de maquinismos!
Sadismo de não sei quê moderno e eu e barulho!

(…)»

Álvaro de Campos, Ode Triunfal (Junho de 1914/Orpheu, n.º1, 1915)

quinta-feira, 12 de junho de 2008

Privação da liberdade, pela liberdade

A Câmara dos Comuns aprovou ontem uma alteração à lei anti-terrorista britãnica, que passará de 28 para 42 os dias de prisão preventiva dos suspeitos de actos terroristas, a fim de dar mais tempo à investigação, antes de proferida a acusação. (Veja-se, por exemplo, no The Guardian, mais notícias e o já acesso debate sobre o tema.)

Tal medida é sempre polémica, pois interfere, de forma, pelo menos aparentemente, contraditória, com um dos direitos mais fundamentais que formam as sociedades democráticas liberais, que impede o Estado de privar o indivíduo da sua liberdade sem um julgamento justo. No entanto, os cuidados, com certeza justificados, com este e outros direitos dos indivíduos, não deve impedir as nossas sociedades liberais de, justamente para zelar pela efectiva liberdade de todos, tomarem as ameaças à segurança dos indivíduos como algo muito sério e prioritário e, portanto, alvo de apertadas e rigorosas medidas normativas de prevenção e sanção.

Os estados democráticos e liberais não podem, pois, cair na irónica e também claramente contraditória situação de, por exemplo, privar pessoas ameaçadas por possíveis actos terroristas da sua liberdade escondendo-as, escoltando-as (como aconteceu com políticos holandeses ameaçados, após o caso das polémicas caricaturas de Maomé), enquanto os suspeitos de terem participado ou virem a participar em actos terroristas vêem, por seu turno, as suas liberdades altamente protegidas, permitindo-se que circulem livremente pelas ruas das nossas cidades, proporcionando-lhes assim amplas oportunidades para poderem praticar actos de brutal mega-violência.

terça-feira, 10 de junho de 2008



Dar a pensar...


«(...) Na Antiguidade, a participação de cada indivíduo na soberania nacional não era, como nos nossos dias, uma hipótese abstracta. A vontade de cada um tinha uma influência real; o exercício dessa vontade era uma satisfação viva e repetida. Como tal, os antigos estavam dispostos a fazer grandes sacrifícios para conservarem os seus direitos políticos e a sua participação na administração do Estado. Cada qual, ao sentir com orgulho o valor do seu sufrágio, encontrava na consciência da sua importância pessoal uma profunda recompensa.

Actualmente, tal recompensa já não existe para nós. Perdido na multidão, o indivíduo quase nunca se apercebe da influência que possui: a sua vontade nunca deixa marcas sobre o conjunto, nem vê com os próprios olhos o resultado da sua cooperação. O exercício dos direitos políticos não nos oferece mais do que uma pequena parcela da satisfação que dele retiravam os antigos; ao mesmo tempo, os progressos da civilização, a tendência comercial da nossa época, a comunicação recíproca dos povos, multiplicam até ao infinito os meios de satisfação particular.

Daqui resulta que devemos ligar-nos, mais do que os antigos, à nossa independência pessoal; de facto, os antigos, ao sacrificarem essa independência aos direitos políticos, sacrificavam menos para obter mais; ao passo que, se fizéssemos um sacrifício idêntico, estaríamos a sacrificar mais para obter menos.

O objectivo dos antigos era a partilha do poder social entre todos os cidadãos da mesma pátria; era a isso que chamavam liberdade. O objectivo dos modernos é a segurança do seu bem-estar privado; e chamam liberdade às garantias que as instituições concedem a esse bem-estar.»

Benjamin Constant, La Liberté des Anciens Comparée à celles des Modernes, trad. port. de António de Araújo, A Liberdade dos Antigos Comparada à Liberdade dos Modernos (Coimbra: Edções Tenacitas, 2001) 16-17.

segunda-feira, 9 de junho de 2008

Reacção do MCLT

O Movimento Cívico pela Linha do Tua (MCLT) já reagiu ao último descarrilamento de uma automotora, ocorrido na passada sexta-feira de manhã, na famigerada (e mal-amada por muitos, que parece nunca a terem percorrido!) linha do Tua, acusando o governo de ocultar partes dos relatórios sobre os acidentes e estudos realizados na linha. Veja-se aqui.

domingo, 8 de junho de 2008

Livros em saldo

Envolta pelo bucolismo dos jardins românticos em redor do Pavilhão Rosa Mota, com o Douro ao fundo, cruzado pelos velhos rabelos carregados com a última colheita de turistas, a 78.ª Feira do Livro do Porto é uma das mais bem ambientadas do país.

Ao contrário, por exemplo, da Feira do Livro de Coimbra, que escolheu um figurino que envolveu espectáculos musicais dentro do pavilhão – coisa que, certamente, pouco beneficiava a consulta e leitura dos livros expostos –, a Feira do Livro do Porto manteve um ambiente sóbrio, propício ao que se espera de uma mostra de livros a preços mais acessíveis – a sua consulta criteriosa com vista a uma selecção de compras. Depois da polémica, os livros são sempre os livros!

Apesar dos preços não serem assim tão mais baixos quanto seria desejável para o “devorador” de livros, é sempre uma actividade agradável percorrer os escaparates em busca de proveitosas e deleitosas leituras. Últimos dias – a decorrer até terça-feira.

sexta-feira, 6 de junho de 2008

O descarrilamento da política do medo

É absolutamente impressionante como a incúria, incompetência e aberrante (para não dizer simiesca) desresponsabilização da empresa responsável (?!) pela manutenção da linha, terá provocado mais um descarrilamento de uma composição na linha ferroviária do Tua.

Parece óbvio que, num país com uma organização ético-política terceiro-mundista, uma linha ferroviária que está condenada a desaparecer não tenha uma manutenção cuidada e exigente (já que vai encerrar...!).

Pior só mesmo o Governador Civil de Bragança aproveitar a ocasião para mostrar que, uma vez que a linha está a dar tantos problemas e, afinal, não é assim tão necessária nem tão-pouco importante, o melhor é mesmo fechá-la! Trata-se de uma grotesca falácia, já que este tipo de acidentes não são propriamente uma inevitabilidade trágica, que obrigasse o homem responsável e tecnologicamente dotado do início do terceiro milénio a desistir de tal empreendimento face às forças da natureza!! Trata-se, pois, de puro terrorismo político, uma vez que gera medo nas pessoas que utilizam ou venham a utilizar aquela linha, procurando levá-las a aceitar a decisão de encerramento como algo absoluta e inquestionavelmente necessário.

domingo, 1 de junho de 2008

Dia Mundial da Criança



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Dar a pensar...


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«O mundo está cheio de desigualdades -- dentro dos países e entre os países. Algumas crianças nascem em lares confortáveis e prósperos e crescem bem alimentadas e bem-educadas. Outras nascem pobres, são mal nutridas e nunca têm acesso a uma educação e tratamento médico suficientes. É claro que isto é uma questão de sorte: não somos responsáveis pela classe económica ou social ou pelo país em que nascemos. A questão consiste em saber quão más são as desigualdades que não são culpa das pessoas que as sofrem. Deverão os governos servir-se dos seus poderes para tentarem reduzir as desigualdades deste género, pelas quais as suas vítimas não são responsáveis?

(...) A principal questão quanto à própria desigualdade é esta: que tipos de causas de desigualdade são erradas? A principal questão quanto às soluções é a seguinte: que métodos de interferir com a desigualdade são certos?»

Thomas Nagel, What Does It All Mean (New York: Oxford University Press, 1987), trad. de Teresa Marques, Que Quer Dizer Tudo Isto? (Lisboa: Gradiva, 1995), 71, 74.


Fotografias...



“...Até ao país do nunca!”
(2008; fotografia sobre ecrán de televisão)
© Miguel Portugal