terça-feira, 10 de junho de 2008



Dar a pensar...


«(...) Na Antiguidade, a participação de cada indivíduo na soberania nacional não era, como nos nossos dias, uma hipótese abstracta. A vontade de cada um tinha uma influência real; o exercício dessa vontade era uma satisfação viva e repetida. Como tal, os antigos estavam dispostos a fazer grandes sacrifícios para conservarem os seus direitos políticos e a sua participação na administração do Estado. Cada qual, ao sentir com orgulho o valor do seu sufrágio, encontrava na consciência da sua importância pessoal uma profunda recompensa.

Actualmente, tal recompensa já não existe para nós. Perdido na multidão, o indivíduo quase nunca se apercebe da influência que possui: a sua vontade nunca deixa marcas sobre o conjunto, nem vê com os próprios olhos o resultado da sua cooperação. O exercício dos direitos políticos não nos oferece mais do que uma pequena parcela da satisfação que dele retiravam os antigos; ao mesmo tempo, os progressos da civilização, a tendência comercial da nossa época, a comunicação recíproca dos povos, multiplicam até ao infinito os meios de satisfação particular.

Daqui resulta que devemos ligar-nos, mais do que os antigos, à nossa independência pessoal; de facto, os antigos, ao sacrificarem essa independência aos direitos políticos, sacrificavam menos para obter mais; ao passo que, se fizéssemos um sacrifício idêntico, estaríamos a sacrificar mais para obter menos.

O objectivo dos antigos era a partilha do poder social entre todos os cidadãos da mesma pátria; era a isso que chamavam liberdade. O objectivo dos modernos é a segurança do seu bem-estar privado; e chamam liberdade às garantias que as instituições concedem a esse bem-estar.»

Benjamin Constant, La Liberté des Anciens Comparée à celles des Modernes, trad. port. de António de Araújo, A Liberdade dos Antigos Comparada à Liberdade dos Modernos (Coimbra: Edções Tenacitas, 2001) 16-17.

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