Depois de o Ministério Público ter arquivado o "caso Portucale", eis que um cidadão – Luís Sequeira, um professor de Coimbra –, se constitui assistente e reabre o processo, em que que estão envolvidos alguns ex-ministros e foram mesmo arrolados como testemunhas o actual PM José Sócrates e o ME Manuel Pinho (veja-se aqui).
Nestes casos pergunta-se sempre se há interesse pessoal em ascenção política; ou comenta-se que se trata de alguma excentricidade auto-promocional. Se no caso da primeira questão não podemos nunca sabê-lo, não me parece, todavia, uma mera excentricidade. Parece melhor ser um acto consciente da mais viva cidadania, contra os abusos e as inércias que se têm vindo a avolumar e a manchar a nossa democracia. Por isso, o que me parece importante nesta iniciativa é o seguinte:
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1. um cidadão move um processo, anteriormente arquivado pelo MP, contra ex-ministros, caso inédito em Portugal, por suspeita de favorecimento, abuso de poder e sobreposição arbitrária de interesses privados aos interesses públicos;
2. refere o cidadão, que o seu móbil é apenas em nome da causa ambiental, mas também o é o profundo desagrado pelo modo como se faz política sem pinga de ética em Portugal e, salvo algumas excepções, com a conivência dos cidadãos;
3. o facto de um cidadão se rebelar deste modo – sereno, legal e, pois, superior – contra abusos de poder de quem julga tê-lo em absoluto, mostra como o sistema democrático concede, justamente, poder aos cidadãos, desde que estes sejam lúcidos e esclarecidos o suficiente e se mostrem suficientemente interessados pelo que lhes concede precisamente as condições básicas para viverem as suas vidas, que é a política;
4. e, at last but not least, o facto de este cidadão esclarecido e lúcido ser um professor, só mostra como ainda há pessoas dignas da profissão fulcral – senão em todas as sociedades, pelo menos da nossa sociedade actual –, que é ser professor, a contrastar, naturalmente, com, quiçá, milhares de outros, que talvez não tenham esta lucidez, esclarecimento e sofram mesmo de alguma acrasia paralisante das suas e das vidas de outros que deles muito dependem.
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Em suma: o problema não são os sobreiros, mas uma certa forma débil e vazia de estar na política e na vida – sem a fortaleza orientadora dos princípios!