quinta-feira, 26 de abril de 2007

33 anos depois… a democracia em perigo de retrocesso!

A democracia – o “governo do povo, pelo povo, para o povo”, segundo a famosa definição de Abraham Lincoln – é o sistema político no qual o povo inteiro (ou pelo menos na sua maioria) toma, e tem o direito (livre) de tomar, as decisões básicas determinantes a respeito de questões importantes de políticas públicas. A democracia é, pois, o domínio da liberdade e do pluralismo. Mas está intimamente relacionada também com a ideia de igualdade (expressa na ideia de “um voto, um homem”) – quer dizer: uma sociedade democrática é uma sociedade na qual existe igualdade (entanda-se: de direitos, de oportunidades).

A dificuldade maior consiste em coordenar e arranjar liberdade e igualdade. Por isso, a democracia está sempre por vir, sempre em construção.

Porém, as dificuldades avolumam-se quando existe a tentação (quase totalitária) de engrossar o poder dos representantes furtando-o ao controlo dos representados. As recentes pressões sobre os media ou as tentativas constantes de definição, por parte do governo, da agenda mediática, ou as medidas anunciadas de centralização do poder das polícias (incluindo a PJ) na figura do PM, ou mesmo algumas medidas populistas ao nível da fiscalidade (levantamento do sigilo bancário ou listas públicas de devedores ao fisco), são medidas que põem em causa dois pilares fundamentais das conquistas de Abril: a liberdade de imprensa e as liberdades individuais.

Registe-se com apreço a intervenção neste sentido, na manhã das comemorações parlamentares, de Paulo Rangel (PSD), que conseguiu conciliar a sobriedade com o espírito crítico, apontando aqueles desvios do poder democrático. (Afinal, os grandes partidos verdadeiramente democráticos não são, felizmente para a própria sobrevivência da democracia, apenas os seus líderes.) As boas intenções de Maria de Belém Roseira (PS), num discurso colorido de erudição (com uma dezena de citações que incluíram, curiosamente, grandes filósofos liberais, para além do tique pedante do momento, que é citar António Damásio!), caiem, contudo, num fundo contraditório de atropelos à própria liberdade! Terá sido um apelo à política com substância?!

Claro que o PM não respondeu cabalmente às críticas de Rangel, porque não podia realmente responder; e numa democracia ainda pouco esclarecida, ainda fica bem afirmar – quando não se tem mais nada para dizer e quando se julga não existir qualquer dever de dizer alguma de substancial – que se trata de uma atitude de «bota-abaixismo» do PSD! Mas o que é certo é que se tratou de um momento político de qualidade democrática: um representante do povo critica justamente um governo que pode estar a afastar-se do povo, quando procura subverter os mecanismos de controlo democrático do poder, introduzindo um défice democrático no seio da própria democracia! (A política de substância contra a política da manipulação mediática!)

A democracia é uma obra por vir, sempre com atropelos. Mas a luta não é pelo passado, deve ser pelo futuro. E a luta agora é, muito naturalmente, contra os retrocessos.

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