Não é sem alguma tristeza que escrevo isto…, mas isto só é possível num país em que a cidadania generalizada, realmente crítica e informada, emigrou e “isto” não é outra coisa – é necessário dizê-lo – senão o resultado de uma pobreza de espírito confrangedora, que não permite a muitas pessoas que ocupam cargos públicos fazê-lo com o mínimo de ética espectável.
terça-feira, 30 de setembro de 2008
Pobres de espírito!
Não é sem alguma tristeza que escrevo isto…, mas isto só é possível num país em que a cidadania generalizada, realmente crítica e informada, emigrou e “isto” não é outra coisa – é necessário dizê-lo – senão o resultado de uma pobreza de espírito confrangedora, que não permite a muitas pessoas que ocupam cargos públicos fazê-lo com o mínimo de ética espectável.
segunda-feira, 29 de setembro de 2008
Não há tempo para rigor!

Muitos professores e algumas escolas vêm agora requerer, com base numa recomendação (algo genérica, diga-se, e, portanto, estéril, sem querer comprometer muito!) do Conselho Científico de Avaliação de Professores (CCAP), a eliminação dos resultados dos alunos como critério no processo de avaliação dos professores. A razão central é fácil de compreender, embora, pelos vistos, não por todos: tal critério poderá perverter o essencial – as reais aprendizagens dos alunos estarão preteridas por um resultado final determinado a priori por uma percentagem de sucesso, que é uma meta a alcançar pelo professor, não tanto no seu trabalho missionário, mas na sua avaliação de desempenho! Pense-se num critério que baseia a avaliação do desempenho do professor no sucesso exponencial dos alunos, que é cada vez mais “estatístico” e menos real! Ora, a única forma de avaliar justa e eficazmente os resultados dos alunos realmente conducente a um incremento da melhoria da praxis docente com consequentes maiores e melhores aprendizagens efectivas dos seus alunos, seria através de rigorosos exames nacionais em finais de ciclo de ensino, que verdadeiramente testassem conhecimentos e competências ensinados e apreendidos. Mas isso é muito pouco popular, pois vivemos um clima tão surreal como paradoxal: crescente necessidade vital de reais qualificações pluridisciplinares e, por outro lado (para atacar a crise!), um facilitismo hedonista pacóvio, que vem adormecendo o povo, através de salvíficos planos tecnológicos (por muito necessários que sejam), que injectam computadores e quadros electrónicos em salas de aula degradadas (mas pintadas de fresco por fora!), qual opiáceo político que mantém os mais desfavorecidos agarrados a um terceiro-mundismo dilacerante.
Só não vê quem não quer ver: num país de muito fraca cultura de avaliação da qualidade do desempenho profissional, começa-se por impor, de modo completamente desenraizado, um processo de avaliação altamente burocratizado (segundo alerta da CCAP), com critérios altamente discutíveis e mesmo pedagogicamente perigosos, que poderá colocar em risco o que resta da escola pública.
Mas… não há tempo para estas considerações incómodas. E é sempre fácil afirmar uma ou outra brilhante sentença travestida de contra-argumento, característica de quem se encontra precisamente desprovido de uma verdadeira qualificação lógico-argumentativa (daquelas que se aprendem na “escola real” e não virtual!), como por exemplo (eis uma das mais imbecilizantes e alienantes): “os professores (pelo vistos, todos!) parecem não querer o sucesso dos seus alunos”!
Aguarda-se o que dirá o ME perante mais uma recomendação de um conselho consultivo criado pelo próprio ME!
quarta-feira, 24 de setembro de 2008
Se não é propaganda...?!

Propaganda ou futuro?

Todavia, este argumento de MLR suscita – a quem se interessa, de facto, por estas questões – duas dúvidas.
1. O que entende MLR e o ME por sucesso escolar? Será um quadro de resultados positivos no final do ensino básico, independentemente daquilo que os alunos, de facto, tenham apreendido, em termos de conhecimentos e competências? Se assim for, como já tive, infelizmente, oportunidade de referir, basta “levantar o pé” e os resultados – não as aprendizagens – “melhoram” e é bem possível atingirem o místico número 100 (%)! E como se “levanta o pé”? Através da megaburocratização kafkiana que pressiona os professores que detenham informações necessárias e suficientes para reprovar o aluno (fazê-lo reaprender melhor!) e através de exames de conhecimentos e competências de “fácil acesso para todos”!
2. Depois, é importante perguntar que condições são as necessárias, que existem nos países em que o sucesso é, de facto, de 100%, que a ME afirma existirem em Portugal. A sra. Ministra não as referiu, a não ser que entenda que essas sejam os “factos” dos nossos alunos serem tão capazes como os europeus, dos nossos professores serem tão qualificados e empenhados como os seus congéneres do restante sol poente e das escolas estarem, em breve, transformadas em escolas do (nosso) futuro… (em termos informáticos, claro!) Mas será que a nossa escola está efectivamente organizada para incrementar hábitos de trabalho e de verdadeira aprendizagem de conhecimentos e competências nos alunos como uma imperiosa necessidade de sobrevivência no mundo de hoje? E os encarregados de educação, terão a mesma concepção dos seus congéneres europeus acerca da verdadeira importância da escola e dos hábitos de trabalho que devem incutir aos seus educandos para a ela se adaptarem e, com isso, crescerem como seres humanos melhor adaptados ao exigente mundo da vida?
Sejamos claros: há francas possibilidades – ou é necessário acreditar nisso – para que o verdadeiro sucesso atinja todos os alunos no ensino básico. Mas são, neste momento, apenas possibilidades, que é necessário colocar em acto!
A sra. Ministra esquece que as verdadeiras condições para atingir tal meta passam por, entre outras: aumentar o número de horas semanais que o curriculum em Portugal, ao contrário do resto da Europa, dedica à Matemática e à língua materna; diminuir o tempo que os alunos passam em áreas não curriculares, como “estudo acompanhado” e, principalmente, “área de projecto” (não tanto porque estas áreas de estudo não façam sentido, mas porque é necessário disponibilizar mais tempo para aquelas disciplinas nucleares); restituir aos professores o tempo, a serenidade e a confiança necessários para que, enquanto eternos apaixonados estudantes que são (devem ser ou devem mostrar que o são!), façam o seu trabalho, que consiste, não em preencher papéis inúteis, mas em preparar (científica e didacticamente) o contacto das crianças e dos jovens com o fabuloso mundo da cultura e do conhecimento humano; e, at last but not least, incrementar, junto dos encarregados de educação, uma verdadeira atitude de orientação responsável e atenta dos seus educandos, instituindo, por exemplo, hábitos de verdadeiramente consequentes visitas às escolas dos filhos, onde encontrarão professores devidamente sensibilizados e qualificados (que os há, embora seja, com certeza, necessário mais e melhor) para os aconselhar, porque a educação é tão importante ou fulcral quanto a saúde! (Haverá, por exemplo, algum item programático no curriculum da educação para adultos, ao nível das Novas Oportunidades, que contemple tão elevado desígnio? Ou a ideia é mesmo apenas atribuir diplomas para aumentar as salvíficas estatísticas?!)
Quando um Ministro da Educação profere aquelas belas palavras, das duas uma: ou tem na sua posse sólidos elementos para mostrar como isso é, efectivamente, possível e quando; ou então está apenas a autopromover-se com vista a uma outra finalidade, que não a de incrementar políticas educativas. É fácil, com o nível cultural e a “filosofia” de vida de muitos encarregados de educação hoje em Portugal, apelar às emoções do povo (mas mesmo assim, já há quem esteja atento)! Mais difícil – porque mais exigente, embora não impossível – é pensar profundamente políticas educativas de verdadeiro sucesso para um verdadeiro futuro de possibilidades para todos.
sexta-feira, 19 de setembro de 2008

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Dar a pensar
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«A tradição democrática liberal é formada por um ideal de liberdade, igualdade e realização que na melhor das hipóteses foi realizado apenas parcialmente e que poderá não estar ainda completamente imaginado. O significado espiritual da história [das] nações democráticas é principalmente a história da busca deste ideal. O coração da tradição liberal é um processo criativo, um método de transformação social e individual, construído para permitir aos homens e às mulheres a incorporação deste ideal.
Steven C. Rockefeller, "Comentário" in: Charles Taylor et al, Multiculturalismo, trad. port. de Marta Machado (Lisboa: Instituto Piaget, 1998) 105, 109-110.
segunda-feira, 15 de setembro de 2008
Olímpicos -- amostra fidedigna
quinta-feira, 11 de setembro de 2008
Professores de confiança, políticos nem por isso!
11 de Setembro

terça-feira, 9 de setembro de 2008
Grandes números, pequenas virtudes!
No entanto, o PM e a ME esquecem que:
1. É cada vez mais difícil reprovar um aluno, dado o peso burocrático completamente kafkiano que carregam os docentes, designadamente do ensino básico, se estiverem na eminência de o fazerem.
3. As diminutas percentagens de alunos que não transitaram de ano não mostra necessariamente que houve (por muito que, naturalmente, possa ter havido) um significativo acréscimo no envolvimento de professores, alunos e encarregados de educação nesse sentido: isto porque, por um lado, não é mensurável, nem objectivamente fácil de identificar como causa necessária, o empenhamento de professores, muito menos de alunos e encarregados de educação, no sentido de ter sido esse o factor determinante para a melhoria dos resultados (é claro que todos se esforçaram; mas como saber se o fizeram mais este ano do que em anos anteriores?! Pode dar-se o caso de se terem esforçado o mesmo ou ainda menos e terem obtido melhores resultados, desde que o nível de exigência na prestação de provas e ou o rigor na avaliação tenha diminuído!); por outro lado, o único instrumento fidedigno de avaliação efectiva de conhecimentos e competências, que é um exame nacional, tem vindo a ser utilizado (quando é utilizado!) pelo ME de forma pouco rigorosa e, designadamente neste ano transacto, foi utilizado, por vezes, de modo bastante facilitador dos resultados.
Não está em questão o valor da progressão generalizada dos alunos ao longo do seu percurso escolar. Quantos menos chumbarem, tanto melhor, obviamente! Como também não se questiona aqui a valência pedagógica do modelo (aliás, praticado um pouco por essa Europa fora) baseado no princípio da não-retenção do aluno ao longo da escolaridade obrigatória, fornecendo ao aluno que não adquiriu os conhecimentos e competências mínimas próprias de cada ano ou ciclo, uma ajuda suplementar no ano seguinte para recuperar dessas lacunas. Mas a questão não é essa. A questão é que:
1. Quanto ao modelo da não-retenção, há que fazer um efectivo investimento material, pedagógico e, sobretudo, ao nível das mentalidades (de pais, alunos e também professores) no sentido de empreender verdadeiramente – e não apenas para “inglês/burocrata/papalvo ver” – um conjunto de actividades de recuperação do aluno com essas necessidades; mas assumir também que, mais cedo ou mais tarde (como também acontece por essa Europa civilizada fora!), o aluno em questão vai ter que prestar provas daquilo que realmente aprendeu, bem como assumir que é necessário disponibilizar percursos pedagógicos verdadeiramente alternativos e ajustados às necessidades dos alunos e do mundo do trabalho em que, de qualquer modo, poderá vir a inserir-se de modo proveitoso.
2. E depois é preciso compreender que os efectivos critérios de avaliação de conhecimentos e competências (aqueles que se põem realmente em pratica) têm vindo a decair em termos de rigor e exigência ao longo dos últimos anos, instalando-se no sistema de ensino um ambiente de algum facilitismo (lamentado, por exemplo, por docentes do ensino superior!), em muito boa parte da responsabilidade da inabilidade política deste governo e da sua empobrecedora filosofia romântica para a educação. Em suma, ao invés de se ter criado uma dinâmica de incremento do esforço, empenhamento e esperança, passou-se a ideia (intencionalmente ou não) de que pouco mais há a fazer para melhorar, coisa que todos conseguirão com pouco esforço, já que os critérios da escola (dos mauzões dos professores!) é que estavam desajustados!
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O que se joga na construção de uma barragem
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(Publicado in Terra Quente, 15-08-2008)
quarta-feira, 3 de setembro de 2008
quinta-feira, 28 de agosto de 2008
Aproxima-se um “JAMAIS!”?

De qualquer modo, algo se está a fazer, estejamos descansados: quatro acidentes com quatro vítimas mortais depois… agora sim, o Ministro da tutela considera que vale a pena recorrer a uma equipa especializada independente para proceder à averiguação do estado da linha, das condições de segurança e adequação do material circulante à famigerada linha do Tua! Até porque há por aí, com certeza, muita gente ansiosa pela reabertura da linha, para mais um excitante passeio ferroviário num verdadeiro ambiente de terceiro mundo!
Estará para breve um “JAMAIS!”?
“Lost in Madrid”
Assim se intitulam algumas faixas do álbum “music from Siesta” de Miles Davies/Marcus Miller (1987), que aqui serve para expressar a ideia de quão acolhedora e interessante é a capital espanhola, que, mesmo debaixo de um calor tórrido, em pleno Agosto, consegue cativar o visitante mais exigente e fazê-lo perder-se na sua imensa sumptuosidade.
(Museo Reina Sofia)
A Gran Via, com o seu comércio efervescente, a Puerta del Sol com as suas ruas apinhadas de gente, as sumptuosas esplanadas aspergidas por suaves gotículas de água direccionadas por ventoinhas, espalhadas um pouco por todo o lado, a monumentalidade do Palácio Real, a Ópera, a Plaza Cibeles ou Atocha, a belíssima Plaza Mayor, com a sua arquitectura plena de interesse e os seus bares típicos, ou então o Paseo del Prado com os museus Thyssen, Prado ou Reina Sofia… tudo isto é capaz de preencher as expectativas do mais exigente turista em busca de novos mundos. Só os sumptuosos Museo del Prado e Museo Reina Sofia são capazes de absorver, pelo menos, dois dias de intensa e rica fruição, de Rafael, Goya, Bosch (uma “delícia”!) ou Velázques no primeiro, à arte contemporânea com presença magnânima do surrealismo de Dali, Miró e Picasso no segundo (a contemplação de “Guérnica” é sempre, reiteradamente, avassaladora…). A arte obriga-nos a ver (e a pensar): o belo, o sublime, mas também o trágico.
(Paseo del Prado)
Cidade limpa, bem organizada (sem arrumadores?!), acolhedora, multicultural e aparentemente segura (com policiamento visível em locais e horas estratégicas), Madrid é uma metrópole rica e fascinante. A não perder.
(Gran Via)
(Gran Via)
(Plaza Cibelles)
(Puerta del Sol)
(Ópera)
(Palácio Real)
terça-feira, 26 de agosto de 2008
C’est la vie…! Ou a vergonha de um terceiro-mundismo persistente

Num lapso de tempo de cerca de um ano e meio, mais um (o quarto!) descarrilamento de uma composição do metro de superfície de Mirandela ao serviço da CP na linha ferroviária do Tua. Mais uma vítima mortal. E mais displicência nas declarações oficiais, designadamente do director de comunicação da CP, que, no meio de profícua verborreia politicamente correcta, comunica a profunda ideia de que a vida é um risco constante e que este descarrilamento faz parte das coisas que podem acontecer numa linha férrea… da CP!
Em lugar de comunicar a ideia de que tudo se fará para apurar as causas e as responsabilidades de mais um misterioso acidente ferroviário numa linha em vias de extinção devido à construção da barragem do Tua, e, portanto, transmitindo aos utentes da CP a ideia de que esta empresa tudo fará para assegurar as condições de segurança necessárias à circulação ferroviária em “todas” as linhas do país, comunica, ao invés, a trágica ideia romântica de que é, naturalmente, arriscado viajar em composições ferroviárias da CP ou ao serviço da CP!
Descarrilou mais um comboio na pequena, remota e insignificante linha transmontana do Tua?! Bom… “c’est la vie!” Mas, bom, também é mais uma prova do terceiro-mundismo que teima em caracterizar a forma como o nosso estado (e a nossa sociedade) está (des)organizado. E, ao que tudo indica, é mais uma estranha coincidência na novela dos interesses obscuros em torno da construção compulsiva de uma barragem que, de forma demasiado simplista (para não dizer simplória!), inviabilizará uma linha ferroviária de enorme valia histórico-patrimonial e paisagística e, portanto, de valor acrescentado em termos turísticos para uma região em que o turismo é demasiado importante.
Mas talvez ainda venha a suar um “jamais!” da parte da tutela, relativamente a acidentes completamente injustificados numa linha que teve mais acidentes neste ano e meio que talvez em todo a sua história de mais de um século! Mas, por favor, que ninguém se demita, que isso é característico de países desenvolvidos!
Quem inteligente, com espírito crítico e cultura política (que os há por estas bandas!) fica a aguardar (sentado, claro, para se não cansar!) pelo resultado atempado de mais um inquérito de apuramento de factos e de responsabilidades (ainda faltam dois, dos três acidentes anteriores!). Ou ninguém – como nos países do terceiro mundo – é responsável pelo que aconteceu? Mas também pessoas com aquelas características definidoras de uma cidadania consciente de mundo (que os há muitos por esse Portugal fora), sempre poderão pensar (e agir nesse sentido!) que uma empresa ferroviária que permite mais um estranho descarrilamento ferroviário nesta linha e cujo director de comunicação é capaz de comunicar aquela ideia justificativa completamente medíocre, irresponsável e desrespeitadora dos seus destinatários, merecerá um boicote aos seus serviços por esse país fora… Tal acto não seria apenas uma questão de prudência; seria, sobretudo, uma afirmação de cidadania digna.
Seja crítico – não viaje na CP!
quinta-feira, 7 de agosto de 2008
A justiça começa agora... em Guantânamo

quarta-feira, 30 de julho de 2008
quarta-feira, 16 de julho de 2008
Delícias III

«Uma professora da área de ciências do terceiro ciclo do Ensino Básico (Sintra, 2005) pede aos seus alunos para inventarem uma experiência em que ponham à prova o seu espírito científico. Uma aluna, naturalmente motivada por alguma coisa que ouviu sobre a velocidade da queda dos corpos, resolve fazer experiências para verificar se bolas de diferentes pesos caem de formas diferentes. Faz a experiência com bolas de ping-pong e bolas de ferro e conclui que as segundas caem mais rapidamente. A professora fica muito contente, diz à aluna para apresentar o trabalho num concurso de ciências para jovens e a rapariga apresenta em público os seus resultados. Ora, o que a estudante acabou de fazer foi regredir até Aristóteles (384-322 a.C.). A professora, evidentemente, não conhecia a polémica sobre a queda dos corpos nem a célebre lei da queda dos graves.
No século IV a. C., Aristóteles dizia que os corpos caem tanto mais rapidamente quanto mais pesados são. Quase dois milénios depois, numa série de experiências célebres, muito conhecidas, sobretudo, através do episódio, naturalmente romanceado, da torre inclinada de Pisa, Galileu Galilei (1564-1642) mostrou que os corpos em queda livre caem independentemente do seu peso, e explicou que a observada diferença de velocidades se deve ao atrito, à resistência do ar. [Ver, por exemplo, Stillman Drake, History of Free Fall: Aristotle to Galileo, Toronto, 1989.]
Estas experiências clássicas de Galileu desempenharam um papel na revolução científica que apenas tem paralelo nas conjecturas e observações astronómicas que originaram a revolução heliocêntrica. Evidentemente, a professora nada sabia deste assunto e ajudou a inculcar na aluna e nos seus colegas uma ideia errada que agora custará mais a apagar.
A experiência poderia ter dado resultados altamente positivos se a professora, ao invés de abandonar por completo a aluna, tivesse sabido guiá-la, sugerindo-lhe uma experiência que pudesse levar a conclusões pedagógicas úteis e, finalmente, soubesse criticar os resultados. O ensino experimental em que os jovens devem ser mergulhados deve estar adequado ao tempo, recursos e conhecimentos limitados de que os estudantes dispõem. As experiências pressupõem planeamento e conhecimentos, sobretudo por parte do professor, e não são sinónimo de espontaneidade nem devem ser uma promoção da falta de rigor. Por detrás de tudo isto, além de ignorância científica e pedagógica, está um desrespeito pela ciência e pelo saber e uma extraordinária arrogância. Acreditando, ou fingindo acreditar, que os jovens são capazes de desenvolver um espírito crítico e experimental que se inspira no vazio e não no conhecimento, o romantismo pedagógico quer fazer crer que um jovem, sem preparação de alguma espécie, é capaz de chegar a conclusões científicas que custaram à humanidade muitos anos e muito esforço a conquistar. Este salto de etapas pedagógicas é mais outra manifestação de uma atitude romântica anti-intelectual inspirada no naturalismo de Rousseau.»
In: Nuno Crato, O “Eduquês” em Discurso Directo – Uma crítica da pedagogia romântica e construtivista (Lisboa: Gradiva, 2006) 6ª edição, pp. 87-9.
Sem dúvida que um dos fins do ensino é o desenvolvimento, a um tempo, do espírito criativo e científico. Mas isto… talvez seja demais e, de qualquer modo, pouco contribua efectivamente (talvez, bem pelo contrário) para esse duplo fim!
segunda-feira, 14 de julho de 2008
Mas o Estado é… ladrão?!

1. Criando um imposto sobre os lucros das petrolíferas, o governo de José Sócrates dá mais um esquizofrénico passo no sentido de aumentar o intervencionismo do estado na economia – tanto actua como se se tratasse de um governo liberal (tanto na economia como nos costumes), como faz o contrário, espalhando os tentáculos do Estado pela actividade económica e social (vejam-se os tiques totalitários e, por exemplo, a lei da autonomia das escolas, que é completamente ilusória, quando o ME continua a controlar excessiva e desnecessariamente a direcção das escolas). Se o objectivo era (que não parece que seja) redistribuir riqueza para obviar à escalada dos preços dos combustíveis, não seria melhor deixar de arrecadar menos impostos, descendo o ISP (por pouco que fosse), e, assim, permitir um alívio directo sobre o consumidor e enviar um sinal positivo ao mercado, em vez de criar mais um imposto, que parece mais engordar o Estado, do que aliviar a mingua dos indivíduos?
2. Depois, ainda que a medida seja sustentável, do ponto de vista económico, foi maquilhada de um modo altamente reprovável, do ponto de vista ético-político – adornar mais este “pacote” de medidas supostamente salvíficas com a metáfora do “Robin dos Bosques” é transmitir, de modo (no mínimo) completamente irreflectido, a ideia de que o Estado é um ladrão bom(!), que surge como salvador dos pobres explorados pelos ladrões maus (petrolíferas, vulgo geral: “ricos”) que lhes retiram injustamente o pão da boca. Daqui decorrem duas perversas consequências:
2.1. José Sócrates está, não a tentar resolver os problemas reais de uma crise pior do que se possa querer admitir (o que é sumamente mais difícil de fazer, do que assobiar pelo “Robin dos Bosques”!), mas a produzir mais um forte golpe de propaganda eleitoralista, desta feita na tentativa de recolher votos daqueles que sustentam e sentem “na pele” preocupações sociais (a isto chama-se populismo!) e, mais especificamente, de se introduzir inteligentemente no imaginário da esquerda, “roubando” espaço ao PCP e ao BE.
2.2. Tal iniciativa, maquilhada desta forma, faz atolar, escancaradamente, o governo de Sócrates num dos grandes problemas da justiça distributiva, a saber, até que ponto a tributação (pelo menos excessiva) sobre o produto da actividade livre não é precisamente um roubo e, portanto, uma injustiça, como apontam os filósofos e economistas libertários (como Nozick ou Hayek).
2.3. E, at last but not least, está a alimentar irresponsável e despudoradamente a ideia de que o Estado – conjunto de instituições que substituem o estado de luta de todos contra todos (onde a liberdade desregulada geraria violência e, precisamente, actos de furto!) – pode simplesmente roubar a uns, ainda que com a capa da justiça, para dar a outros, quando o Estado é, justamente, pelo contrário, uma forma de organização da sociedade baseada na ordem, nas regras e na defesa das liberdades e garantias dos indivíduos, que actua e faz actuar com base em princípios éticos e não em actos violentos, próprios do indivíduo egoísta que procura satisfazer, por todos os meios, os seus interesses pessoais. Transmite-se, deste modo, a ideia perigosa de que o Estado é impotente para ordenar eticamente a sociedade, introduzindo dúvidas sobre a legitimidade dessa sua fundamental função (“se não vai a bem, vai a mal”!).
Quando um dos entraves ao desenvolvimento – não só económico, mas primeiramente ético e político – do país é a atitude crescente de actuar há margem da lei e da ética contra os outros e contra o Estado (que continuamos a não saber muito bem o que é!), era exigível e não apenas desejável, que o exemplo viesse de cima. Em vez disso, usa-se o “Robin dos Bosques” para ajudar – de modo completamente anacrónico e descontextualizado –, não o “povo”, mas o PS de Sócrates... a ganhar eleições!
sexta-feira, 11 de julho de 2008
Delícias II

«”Piaget considera igualmente que os conceitos matemáticos se desenvolvem espontaneamente nas crianças, não havendo necessidade de serem ensinadas directamente pelos professores. No entanto, existe uma parte do conhecimento matemático que é do tipo convencional e terá de ser ensinada.” (Nota de pé de página da autora: “É o caso de todos os símbolos aritméticos […]”.) [Luísa Maria de Almeida Morgado, O Ensino da Aritmética: Perspectiva Construtivista, Coimbra, Almedina, 1993, p. 29.]
Para além do abuso intelectual que é reclamar esta ideia absurda para Piaget, sem qualquer referência aos seus escritos, destaque-se a conclusão deste parágrafo: para respeitar o desenvolvimento da criança, os professores nada lhe devem ensinar de conteúdo matemático. Apenas as convenções gráficas e outras. Pense-se um pouco. Dever-se-á deixá-la descobrir por si própria os números primos, as regras de proporcionalidade e o teorema de Pitágoras?»
In: Nuno Crato, O “Eduquês” em Discurso Directo – Uma crítica da pedagogia romântica e construtivista (Lisboa: Gradiva, 2006) 6ª edição, p. 110.
quinta-feira, 10 de julho de 2008

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Hannah Arendt, Verdade e Política, trad. port. de Manuel Alberto (Lisboa: Relógio d’Agua Ed., 1995) p. 9.
quarta-feira, 9 de julho de 2008
Ministérios da Educação - Ministérios da Propaganda!
Anti-americanismo imprudente

Para além do anti-americanismo quase (para não dizer mesmo) primário, revelado no exagero imprudente das declarações proferidas, e do facto de Mário Soares (como, em geral, toda a esquerda, incluindo a socialista, tem tendência para fazer) ter esquecido os massacres de Staline, revelam, sobretudo, um profundo desconhecimento da problemática filosófico-política envolvida nesta questão. (Curiosamente, deve conceder-se a Mário Soares, paradoxalmente, uma das mais bem esclarecidas mentes da política nacional!)
Recentemente, o Supremo Tribunal dos E.U.A. concedeu, e parece-me que bem, direitos iguais aos presos de Guantanamo – privados da sua liberdade com base em suspeitas de participação em actividades terroristas, mas muitos sem terem ainda sido formalmente acusados, e que seriam julgados por um tribunal militar – para poderem recorrer aos tribunais comuns. Esta decisão de reforço dos direitos e liberdades daqueles presos funda-se, em última análise, numa tradição do pensamento político ocidental muito influente nos sistemas políticos contemporâneos, que consiste em defender que a natureza, o âmbito e o objectivo da autoridade política deve ser entendido em relação com a prioridade atribuída à liberdade humana. Desde Maquiavel, Locke, Thomas Paine, J. S. Mill, até Rousseau, Hegel ou T. H. Green e mesmo aos anarquistas e marxistas, que a promoção da liberdade é considerada a finalidade da política. Claro que há diferenças de concepção: em alguns casos é vista como um bem em si mesma, noutros como condição necessária para a realização de outros valores relacionados com o bem-estar humano; alguns (como Rousseau, Hegel ou Green) consideram-na como atributo social, outros (como Locke ou J. S. Mill) concebem-na em termos individualistas.
É esta complexa tradição liberal que dá forma, em boa parte, ao modo como se concebe hoje, nas sociedades democráticas e liberais, o papel da política. É ela que deu origem aos Direitos Humanos, entre os quais se encontra o direito a não ser privado da sua liberdade sem acusação formada. É nela que se ancora a indignação de Mário Soares.
No entanto, o Ex-Presidente da República esquece, para além do facto do poderoso terrorismo, que ameaça justamente as nossas sociedades democráticas liberais, uma outra longa tradição do pensamento político ocidental, que, irremediavelmente, deve aqui ser invocada por ser um outro pilar fundacional do modo como se tem entendido a finalidade da política: a identificação e a manutenção de uma ordem apropriada sempre foram vistas como uma condição prévia necessária para que o Estado organize formas meritórias da existência humana. Com a excepção de marxistas e anarquistas, tem-se pensado que as capacidades coercivas e persuasivas do Estado eram essenciais para a criação da ordem. É claro que podemos vislumbrar concepções “negativas” de ordem: Agostinho, Lutero, Hobbes e os modernos proponentes do governo autoritário (Carlyle, Maurras ou Hitler) defenderam a ordem como meio de reprimir as más acções e ou compensar as deficiências morais e intelectuais de grande parte da população. Mas também podemos encontrar concepções “positivas” de ordem: autores como Platão, Aristóteles, Tomás de Aquino, Rousseau, Hegel e Green defenderam uma conjugação de formas de ordem particulares com a necessidade de estabelecer condições de cooperação, nas quais os seres humanos pudessem prosseguir outros valores fundamentais, designadamente o valor da liberdade!
Ora, no mundo globalizado de hoje a questão da ordem é novamente suscitada como nunca: a tendência para a globalização envolve formas de interacção, interdependência e direcção, que não só vão para além do Estado como ameaçam transcendê-lo. E a ameaça do terrorismo é grotescamente demasiado real para ser esquecida. É neste sentido, que o cosmopolitismo volta a ser encarado com profunda seriedade e pragmatismo, através, designadamente, da concepção teórica em curso de um governo mundial.
Não podemos, pois, esquecer que a defesa da liberdade de suspeitos de terrorismo pode colidir com a liberdade de indivíduos que, não só não são suspeitos de tal crime, como apenas podem viver se tal crime não for perpetrado (pense-se nisto!). Para tal, não podemos afastar-nos muito de uma forma “positiva” de encarar a ordem como meio do Estado poder proporcionar condições necessárias para poderem ser vividos pelos indivíduos outros valores, tais como a fundamental liberdade.
terça-feira, 8 de julho de 2008
Delícias I

«Vejamos extractos de um livro dedicado à preparação de professores do ensino básico e muito recomendado em Escolas Superiores de Educação. A autora apresenta-se desde o início como apoiante da perspectiva construtivista, que explicitamente reconhece inspirar os fundamentos do programa de matemática do 1.º ciclo (1990).
“O papel do professor não é pois o de transmitir ideias feitas aos alunos mas de os ajudar, através das tarefas apresentadas, a construir os seus próprios conhecimentos. (…) Sendo assim, o professor deverá respeitar sempre a opinião do aluno e, mesmo quando esta é incorrecta, evitará emitir sobre esta juízos de valor.” [Luísa Maria de Almeida Morgado, O Ensino da Aritmética: Perspectiva Construtivista, Coimbra, Almedina, 1993, p. 25.]
Curiosa esta designação para conhecimento: “ideias feitas”… Mais uma vez, parece sensato que o ensino não seja a transmissão de preconceitos. As não devem os professores transmitir aos alunos a “ideia feita” de que a República foi implantada em 1910, nem a “ideia feita” de que um triângulo tem três vértices? E devem “evitar emitir juízos de valor”? A classificação de certo ou errado não constitui um juízo de valor? Deve ser evitada pelo docente? É isso que quer dizer “respeitar sempre a opinião do aluno”? Pelos vistos, há quem o defenda e dê significado dogmático ao apelo ao “respeito”.»
In: Nuno Crato, O “Eduquês” em Discurso Directo – Uma crítica da pedagogia romântica e construtivista (Lisboa: Gradiva, 2006) 9ª edição, pp. 109-110.
segunda-feira, 7 de julho de 2008
A verdade matemática!

2004 – 8,6 valores
2005 – 8,1 valores
2006 – 8,1 valores
2007 – 10,6 valores
2008 – 14,0 valores
O ME adiantou que tal evolução nos resultados se ficou a dever ao maior empenho dos alunos, que estudaram mais, dos professores, que ensinaram melhor, e ao facto de ter sido concedido mais tempo para realizar os exames.
A questão que se coloca é a de saber se a melhoria dos resultados se deve, efectivamente, ao facto dos alunos terem, de um ano para o outro (de 2006 para 2007 e, sobretudo, de 2007 para 2008), estudado e aprendido mais e ao facto dos professores terem passado, de um ano para o outro, a ensinar mais e melhor. Ou seja, mais precisamente: poderemos servir-nos destes exames realizados ao longo destes anos, para saber se os alunos sabem realmente mais Matemática?
O argumento que tem sido verbalizado pelo Matemático Nuno Crato, Presidente da Sociedade Portuguesa de Matemática (SPM), é o de que, com base nestes dados, não podemos saber realmente isso, uma vez que: tem variado a estrutura dos exames ao longo dos anos; tem variado o tipo de questões formuladas; tem variado (tendencialmente, desde o ano passado, decrescido, principalmente este ano) o grau de dificuldade; têm variado os critérios de correcção das provas; tem variado o tempo de duração das provas (este ano acresceu mais 30 minutos!). Com todas estas variações, não mantendo um padrão mais ou menos coerente na forma como se testam e avaliam conhecimentos e competências, não é de todo possível extrair qualquer conclusão cientificamente fidedigna ou objectiva, a partir destes instrumentos mal elaborados, sobre a evolução das aprendizagens dos alunos na disciplina de Matemática.
É claro que toda a gente(?!) gostaria que os resultados nas provas da disciplina-rainha do sistema das ciências da era moderna, que os alunos das escolas portuguesas obtivessem, fossem, efectivamente, um espelho mais real das suas aprendizagens e, portanto, um verdadeiro auxílio inestimável para as suas vidas futuras. É claro também que a SPM e outros críticos, como a Associação de Professores de Matemática (APM) assumem, com algum natural regozijo, que tem havido uma preocupação do ME em alterar o ainda “mau estado” do desempenho matemático dos nossos alunos, designadamente através do Plano de Acção para a Matemática. Mas, de facto, este plano, como alertou hoje a APM, não abrangeu estes alunos do 12.º ano (iniciou-se para os alunos do 9.º ano em 2006/2007), pelo que não poderia ser um factor responsável por estes resultados. E depois não podemos fazer uma correlação directa entre os resultados nestes exames, com todas as variações descritas, e o que eles deveriam, pelo menos em parte (tanto quanto é possível), avaliar, que eram os conhecimentos e competências que os alunos efectivamente dispõem no final de um ciclo crucial de aprendizagens.
Além do mais, sabe-se que as reformas introduzidas num qualquer sistema de ensino demoram a ter resultados fiáveis. O único estudo credível, que compara os desempenhos matemáticos de alunos de vários países em todo o mundo (o PISA, da OCDE), mostra que, de 2003 para 2006 (últimos dois estudos efectuados), o desempenho dos alunos portugueses teve uma oscilação muitíssimo menor do que aquela que o ME quer atribuir com base nestes exames nacionais, com as deficiências científico-pedagógicas apontadas.
Portanto, fazer crer que estes resultados nestes exames espelham conhecimentos e competências matemáticas efectivamente adquiridas pelos alunos e que isso é o resultado das imperfectíveis políticas educativas de suposto sucesso implementadas pelo ME, conduzido por Maria de Lurdes Rodrigues, é demasiado falso para parecer ser verdade.
A “verdade matemática” é evidente. As consequências políticas não o são menos.