Sinto que paira no ar uma complexa e paradoxal perplexidade: curioso é como muitos – comentadores, políticos sérios e população em geral – não sabem muito bem o que pensar realmente (e não me refiro apenas ao que dizem ou são “obrigados” a dizer) de todas estas alterações ao Estatuto da Carreira Docente, avaliação em particular, bem como da contestação dos professores. Há a clara convicção de que talvez esteja em curso uma das mais fortes instabilidades no sistema de ensino em Portugal. Mas há uma espécie de pudor em admitir também que talvez não seja apenas do lado do governo que está o desgoverno!
Pensemos nas contestações dos professores. Talvez alguns professores contestem, simplesmente porque desesperam pelo dia em que o seu trabalho seja efectivamente levado a sério. Como? Dotando-o dos instrumentos político-pedagógicos e materiais indispensáveis para que de um sistema de ensino se possa esperar que resulte em pessoas efectivamente qualificadas, instruídas e ética e profissionalmente adaptadas à vida adulta numa sociedade moderna, bem organizada, democrática e liberal!
Depois, haverá aqueles que engrossam de indignação porque está em curso uma mudança, que simplesmente os obrigará a fazer ajustes, alterações qualitativas, que incomodam.
Mas haverá também aqueles – poucos, é certo – que se manifestam porque sim, contra tudo... contra “a sinistra!”, como muitos (senhores professores, claro!) vociferam, sem a polidez de quem, tendo argumentos, não necessitaria de mais nada!
Mas há também os que não se manifestam – serão muitos?! – por que não há energia, hábito e/ou estofo intelectual para pensar, muito menos criticamente, sobre problemática tão complexa, como é a que encerra a sua própria missão – a educação e o ensino!
É claro que também há ainda uma outra quota – a dos “muito bons” e “excelentes” renegados, atrofiados pela pressão do disseminado medianismo rastejante! –, que, não indo em manifestações de rua, fica em casa a pensar que... ainda não será desta que vamos ter uma escola moderna, com profissionais destemidos porque qualificados e naturalmente enquadrados num ambiente serena e naturalmente competitivo (na melhor, que a há, acepção do termo), de quem, representando o seu saber, o procura com esforço e com empenho o dissemina e, confiante, se entrega a um processo de verdadeira avaliação – portanto, uma escola adaptada ao tempo e às efectivas necessidades dos alunos, que é, se alguém se lembrar ainda deles, claro, em serem alimentados!
Ponto crucial, pois, da contestação dos professores: havia (haverá ainda?!) muitos adormecidos na sua simples existência mais ou menos alienada, devido, simultaneamente, à falta de auto e hetero exigência no desempenho da profissão e à já tradicional ronronante e quase “apocalíptica” (não construtora, pelo menos!) forma de ser portuguesa, que faz atolar muita gente na acrasia e no vazio intelectual. Mas terão despertado para uma verdadeira reflexão auto e não apenas hetero-crítica acerca de políticas, mas também de práticas educativas? Estaremos nós, professores, a pensar – o governo já se viu que não – profunda e efectivamente na educação e, portanto, no futuro dos alunos enquanto neófitos carentes do mestre e no futuro do país enquanto sociedade organizada, em que faz sentido viver?
As políticas reformistas deste governo na área da educação têm sido manifestamente inconsistentes, sobretudo porque querem fazer crer, aos mais incrédulos, que se está a atacar na melhoria dos resultados. Nada mais errado: tudo se encaminha, paulatina e indolentemente, para que o facilitismo, há muito no terreno e com facilidades de implementação, se transforme em gordos números de ilusório sucesso. Eis o que resta do, ainda por cima, pior socialismo deste governo: a tirania da igualitarização e a doutrinação que lhe subjaz (tudo começa na escola!), que tolhe quantas crianças e jovens se apresentem pela frente – não saber, passar, passar e todos de modo igual, eis o lema!
A ideia é: já que muito árduo seria impor paulatinamente (e demoraria tempo, não eleitoral e orgulhosamente útil!) um maior rigor no ensino e aprendizagem, conduzindo as escolas, e dotando-as de efectivos meios (materiais e humanos), a melhorarem as suas intervenções, por exemplo junto dos alunos mais desfavorecidos, no sentido de estes virem a aumentar os seus conhecimentos e melhorarem efectivamente as suas competências testadas, não apenas continuamente, mas também em exames externos bem elaborados, então é melhor (politicamente mais fácil e visível!) reduzir efectivamente o nível de exigência dos conhecimentos e competências efectivamente apreendidos, para que aqueles que, por várias razões, incluindo as sociais, têm mais dificuldades em aprender, não estejam tão longe dos que as têm, apesar de tudo, menos. Se na hora de mostrar qualificações – para a vida pessoal, social e profissional – elas não existirem, alguém terá a culpa!
Mas, por outro lado, a situação educativa em muitas escolas por esse país fora – recorrendo aqui à amostra de uma dezena que frequentei como professor, de Évora a Chaves –, embora naturalmente com boas honrosas excepções, é lastimavelmente polvilhada de pequenas e consentidas incompetências (como acontece, aliás, em outros grupos profissionais!), algumas das mais bizarras e aberrantes que talvez seja difícil imaginar, plasmando assim a injustiça nos rostos de tantas crianças e jovens, que muito necessitariam dessa preciosa intervenção, se fosse séria, mas cujo futuro é, assim, também por tal, colocado em risco.
E há – como se vai começando já, devagarinho, a compreender – duas espécies de causas para esse mau funcionamento larvar de, pelo menos, algumas escolas, com consequências nefastas para alunos, pais e toda a sociedade:
Pensemos nas contestações dos professores. Talvez alguns professores contestem, simplesmente porque desesperam pelo dia em que o seu trabalho seja efectivamente levado a sério. Como? Dotando-o dos instrumentos político-pedagógicos e materiais indispensáveis para que de um sistema de ensino se possa esperar que resulte em pessoas efectivamente qualificadas, instruídas e ética e profissionalmente adaptadas à vida adulta numa sociedade moderna, bem organizada, democrática e liberal!
Depois, haverá aqueles que engrossam de indignação porque está em curso uma mudança, que simplesmente os obrigará a fazer ajustes, alterações qualitativas, que incomodam.
Mas haverá também aqueles – poucos, é certo – que se manifestam porque sim, contra tudo... contra “a sinistra!”, como muitos (senhores professores, claro!) vociferam, sem a polidez de quem, tendo argumentos, não necessitaria de mais nada!
Mas há também os que não se manifestam – serão muitos?! – por que não há energia, hábito e/ou estofo intelectual para pensar, muito menos criticamente, sobre problemática tão complexa, como é a que encerra a sua própria missão – a educação e o ensino!
É claro que também há ainda uma outra quota – a dos “muito bons” e “excelentes” renegados, atrofiados pela pressão do disseminado medianismo rastejante! –, que, não indo em manifestações de rua, fica em casa a pensar que... ainda não será desta que vamos ter uma escola moderna, com profissionais destemidos porque qualificados e naturalmente enquadrados num ambiente serena e naturalmente competitivo (na melhor, que a há, acepção do termo), de quem, representando o seu saber, o procura com esforço e com empenho o dissemina e, confiante, se entrega a um processo de verdadeira avaliação – portanto, uma escola adaptada ao tempo e às efectivas necessidades dos alunos, que é, se alguém se lembrar ainda deles, claro, em serem alimentados!
Ponto crucial, pois, da contestação dos professores: havia (haverá ainda?!) muitos adormecidos na sua simples existência mais ou menos alienada, devido, simultaneamente, à falta de auto e hetero exigência no desempenho da profissão e à já tradicional ronronante e quase “apocalíptica” (não construtora, pelo menos!) forma de ser portuguesa, que faz atolar muita gente na acrasia e no vazio intelectual. Mas terão despertado para uma verdadeira reflexão auto e não apenas hetero-crítica acerca de políticas, mas também de práticas educativas? Estaremos nós, professores, a pensar – o governo já se viu que não – profunda e efectivamente na educação e, portanto, no futuro dos alunos enquanto neófitos carentes do mestre e no futuro do país enquanto sociedade organizada, em que faz sentido viver?
As políticas reformistas deste governo na área da educação têm sido manifestamente inconsistentes, sobretudo porque querem fazer crer, aos mais incrédulos, que se está a atacar na melhoria dos resultados. Nada mais errado: tudo se encaminha, paulatina e indolentemente, para que o facilitismo, há muito no terreno e com facilidades de implementação, se transforme em gordos números de ilusório sucesso. Eis o que resta do, ainda por cima, pior socialismo deste governo: a tirania da igualitarização e a doutrinação que lhe subjaz (tudo começa na escola!), que tolhe quantas crianças e jovens se apresentem pela frente – não saber, passar, passar e todos de modo igual, eis o lema!
A ideia é: já que muito árduo seria impor paulatinamente (e demoraria tempo, não eleitoral e orgulhosamente útil!) um maior rigor no ensino e aprendizagem, conduzindo as escolas, e dotando-as de efectivos meios (materiais e humanos), a melhorarem as suas intervenções, por exemplo junto dos alunos mais desfavorecidos, no sentido de estes virem a aumentar os seus conhecimentos e melhorarem efectivamente as suas competências testadas, não apenas continuamente, mas também em exames externos bem elaborados, então é melhor (politicamente mais fácil e visível!) reduzir efectivamente o nível de exigência dos conhecimentos e competências efectivamente apreendidos, para que aqueles que, por várias razões, incluindo as sociais, têm mais dificuldades em aprender, não estejam tão longe dos que as têm, apesar de tudo, menos. Se na hora de mostrar qualificações – para a vida pessoal, social e profissional – elas não existirem, alguém terá a culpa!
Mas, por outro lado, a situação educativa em muitas escolas por esse país fora – recorrendo aqui à amostra de uma dezena que frequentei como professor, de Évora a Chaves –, embora naturalmente com boas honrosas excepções, é lastimavelmente polvilhada de pequenas e consentidas incompetências (como acontece, aliás, em outros grupos profissionais!), algumas das mais bizarras e aberrantes que talvez seja difícil imaginar, plasmando assim a injustiça nos rostos de tantas crianças e jovens, que muito necessitariam dessa preciosa intervenção, se fosse séria, mas cujo futuro é, assim, também por tal, colocado em risco.
E há – como se vai começando já, devagarinho, a compreender – duas espécies de causas para esse mau funcionamento larvar de, pelo menos, algumas escolas, com consequências nefastas para alunos, pais e toda a sociedade:
1. naturalmente na sua base, a desorientação política, pois há muito que quem governa não tem investido em reflexão educativa, com a profundidade intelectual que a educação exige, para construir uma escola que fosse democrática, não apenas nas relações de força/poder que nela vivem, mas, sobretudo, na facilitação de efectivos conhecimentos e competências verdadeiramente libertadores e edificadores de futuro para crianças e jovens;
2. mas, apesar de tudo, também devido à inépcia e irresponsabilização indolente e consentida de muitos professores, que, desde o 25 de Abril, penso que talvez ainda não tenham encontrado verdadeiramente a sua real e profunda dignidade profissional.
Se, ainda assim, os professores são alvo de confiança dos seus concidadãos (lembremo-nos de estudo recente), como, v.g., os políticos não são, é por naturais generalizações mais ou menos apressadas do povo, em geral pouco esclarecido acerca de educação, para quem está, ainda assim, tudo bem na escola (!), mas também – sejamos justos – porque há bolsas de resistentes, de pessoas rectas e apaixonadas pelo múnus de ensinar e fazer aprender, que, apesar de tudo, continuam a lutar, não contra alguém, mas pelos alunos e pela sua própria dignificação pessoal e profissional.
Em suma: se o novo ECD é uma peça de poupança pública e não de política educativa (seguindo a lógica da racionalização de meios), pleno de incongruências e injustiças causadoras de prováveis e duradouras instabilidades nas escolas, perfeitamente evitáveis; se este novo modelo de avaliação, em particular, não escapa às críticas mais fundamentadas (outras há que, infelizmente, não têm consistência!); se os problemas da educação não se vão resolver perseguindo os professores; também é verdade que, do lado do desempenho docente há algo a fazer – tem é que ser sério. (Mas será que tem que ser imposto? Talvez!). O que se pede é que a educação, coisa séria, seja tratada com seriedade – como diz o povo: "doa a quem doer"! Ou esse rigor é só para os outros (políticos, médicos, juízes...)?! (Como nós gostamos de, por um lado, exigir dos outros, mas, por outro, também facilmente nos desculpamos com os vícios dos outros!)
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Não elegi nem vou, muito provavelmente, reeleger este governo. Mas, no que toca a políticas educativas (e outras) verdadeiramente reformistas, espero, sentado para me não cansar, por alternativas – substanciais, claro!
(Entretanto, sentado, vou aproveitando para trabalhar… e pensar!)
(Entretanto, sentado, vou aproveitando para trabalhar… e pensar!)
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