quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

Guia para acéfalos?! (2)

O guia da avaliação do desempenho dos docentes mostra mais. Mostra alguma (infelizmente, já habitual) incompetência de quem trabalha nos prestabilíssimos serviços deste Ministério de excelência, no que toca a redigir textos (que tal um exame de acesso para candidatos a receber dinheiro dos contribuintes, nos vários institutos estatais?), a interpretar leis (ou seria mesmo isso que a sra. Ministra queria que lá se escrevesse?) e a manipular conceitos.
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Senão, vejamos (entre outros):
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«Fica concluído, desta forma, o processo de avaliação de desempenho docente, que, neste ciclo avaliativo, só terá efeitos positivos para a carreira dos docentes, uma vez que:
(…)
• os professores que são classificados com Muito Bom e Excelente têm um ritmo de progressão mais rápido e, no caso de obterem tais classificações em dois ciclos avaliativos consecutivos, terão direito a um prémio de desempenho.»
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Agora, compare-se esta pérola da redacção ministerial, em auxílio dos ignorantes professores, com aquilo que define um governo democrático, que é o facto de governar by the rule of law:
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«1 - A atribuição da menção qualitativa de Excelente durante dois períodos consecutivos de avaliação do desempenho determina a redução de quatro anos no tempo de serviço docente exigido para efeitos de acesso à categoria de professor titular.
2 - A atribuição da menção qualitativa de Excelente e Muito Bom durante dois períodos consecutivos reduz em três anos o tempo mínimo de serviço docente exigido para efeitos de acesso à categoria de professor titular.
3 - A atribuição da menção qualitativa de Muito Bom durante dois períodos consecutivos reduz em 2 anos o tempo mínimo de serviço docente exigido para efeitos de acesso à categoria de professor titular.»
(art.º 48.º "Efeitos da avaliação", do Estatuto da Carreira Docente)
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No entanto:
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«4 - O número de lugares a prover nos termos do n.º 1 não pode ultrapassar a dotação a fixar anualmente por despacho do membro do governo responsável pela área da educação, ponderados os resultados da avaliação externa do estabelecimento escolar e ainda as perspectivas de desenvolvimento da carreira docente.»
(art.º 38.º "Acesso", do ECD)
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E até porque (mais importante ainda):
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«1 - A progressão na carreira docente consiste na mudança de escalão dentro de cada categoria.
2 - O reconhecimento do direito à progressão ao escalão seguinte da categoria depende da verificação cumulativa dos seguintes requisitos:
a) Na categoria de professor, da permanência de um período mínimo de serviço docente efectivo no escalão imediatamente anterior, com, pelo menos, dois períodos de avaliação de desempenho em que seja atribuída a menção qualitativa mínima de "Bom"
(...)».
(art.º 37.º "Progressão", do ECD) .
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Quer dizer:
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1. Quanto ao "ritmo de progressão mais rápido", segundo a legislação em vigor, tal constitui uma errada interpretação da lei e um uso falaciosamente ambíguo e inconsistente do conceito de "progressão na carreira", pois, mesmo com aquelas classificações, o ritmo de progressão na carreira não é alterado; o que existe, como se pode ler, é a possibilidade de antecipar o concurso a professor titular; mas até lá, o professor progredirá sempre com o mesmo ritmo e, caso não seja admitido ao lugar de professor titular, o seu precurso teve e continuará a ter exactamente o mesmo ritmo do professor que sempre foi classificado com Bom!
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2. A expressão "no caso de obterem tais classificações em dois ciclos avaliativos consecutivos" encontra-se erradamente colocada na frase, já que é condição mínima para o suposto (mas indevidamente usado) "ritmo de progressão mais rápido" e não apenas para o "prémio de desempenho" e, por isso, deveria ter, logicamente, antecedido a primeira das consequências e não apenas a última -- erro de sintaxe, portanto, que inviabiliza a correcta e fácil compreensão do enunciado.
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3. Não parece eticamente correcto acenar com um prémio de desempenho que, apesar de previsto no art.º 63.º do ECD, não está ainda regulamentado, designadamente quanto ao seu montante. Mesmo que deplorável, porque desrespeitadora da dignidade pessoal, intelectual e profissional dos professores, será pura propaganda?
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É, pois, mesmo aliciante para os professores procurarem ser muito bons ou excelentes! (O aliciante pecuniário, talvez o único verdadeiro incentivo actualmente "esboçado", embora não necessariamente o mais importante para quem cumpre tão nobre missão, ainda não está definido. É supresa?! Que bom... brincar às surpresas!) Mais uma vez: nota máxima para toda a equipa ministerial... que não precisa de ser avaliada, claro.

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